sexta-feira, 1 de março de 2019

Covilhã - Pleitos entre o Bispado da Guarda e o concelho da Covilhã sobre o lugar de Caria I



Hoje iniciamos a publicação de alguns documentos existentes no espólio de Luiz Fernando Carvalho Dias referentes a várias contendas entre o Bispado da Guarda e o concelho da Covilhã, sobre a actual vila de Caria, que tiveram o seu início no último quartel do século XIII.
O primeiro destes documentos, da era de 1318, ano de 1280, refere uma contenda entre D. Estêvão, Bispo da Guarda, representado pelo seu procurador Lourenço Vasques e o concelho da Covilhã, cujo procurador é Vicente Mendes, seu juiz, no reinado de D. Dinis. A razão deste pleito é: “… q֮ o dicto Bispo dizia que esse Conçelho sse tendia a lhi ffazer algũus agravamentos en na ssa aldeya de Caria e a ffazer hi justiça e ffilhar os ome֮s q֮ eles prendiam…”

Caria é vila desde 19 de Dezembro de 1924; está localizada a sul do concelho de Belmonte e confronta com os concelhos da Covilhã, Fundão e Sabugal. (1)

Sobre a origem de Caria já publicámos no nosso blogue um documento das inquirições de D. Dinis à comarca da Beira, que transcrevemos:


§ Item A aldeya que chamam caria dizem as testemunhas que o dayam martim caria ficou em esse logar ante que fosse pobrado hua cavaleria do herdamento de sseu padre e pobroua e foy filhando do herdamento do conçelho e em esto matarõm no e veo hy o bispo dom Rodrigo filhar quamto avia per Razom que era dayam e Reffertou lho o concelho de covilhãa que lhis nom filhasse o sseu e escomumgoos e andarom gram tempo escomungados e fez esta aldeya de caria em que moram bem dozemtos homees que todos fazem foro ao bispo da guarda e mete hy ho bispo seus juizes e seu chegador e seu moordomo E nom querem hir a juizo dos juizes de covilhaam nem obedecem ao conçelho em nenhua Rem nê querem Reçeber moordomo del Rey. E esta poboa se comecou des tempo del Rey dom ssancho prestumeiro. § Nom se defenda esta aldeya per Rezom donrra e ent hy o moordomo ou andador ssegundo foro e custume de covilhaam e nõ juiz met huse segûdo o fforo de covilhaam. (2)


Publicámos também uma monografia da autoria de João Macedo Pereira Forjaz, cujo capítulo VII é dedicado às "Contendas que a Covilhã teve com o lugar de Caria e suas decisões" (3)



Acompanhemos a leitura destes documentos de D. Dinis:

- D. Dinis – 3 de Outubro 1318 E.  (Ano 1280)
- D. Dinis – 3 de Abril 1353 E. (ANO 1315) e certidão (25 de Junho de 1353 E.)


Sabham todos como eu martim fernãdes tabelliom de nosso senhor el Rey en Covilhaa vi e ly hũa carta desse meesmo ssenhor escrita em porgaminho de coiro e ssellada do sseu ssello vermelho pendente daq֮l carta o teor de vervo a vervo tal e Dom Denis pela graça de deus Rey de Portugal e do Alguarve a quantos esta carta virem ffaço ssaber q֮ ssobre contenda q֮ era perante mj֮ antre Dom Stevom Bispo da Guarda per Lourenço vaasques sseu procurador avondosso per poder de hũua procuraçom avondossa que en eu vj da hũa parte o Conçelho de Covilhaa per vicente meendes sseu juyz e sseu procurador avondosso da outra per rrazô q֮ o dicto Bispo dizia que esse Conçelho sse tendia a lhi ffazer algũus agravamentos en na ssa aldeya de Caria e a ffazer hi justiça e ffilhar os ome֮s q֮ eles prendiam e o procurador do dicto Concelho dizia q֮ se nom tendia a mais que era contehudo en hũu compromisso que ffoy ffecto antre Dom Jhoanne Bispo que ffoy em outro tempo da Guarda e o cabido desse logar da hũa parte e os juyzes e o Conçelho de Covilhaa da outra que mostrarom perante mjm da qual o teor a tal he. Sabham todos quantos esta carta vjrem e leer ouvjrem que a mjm o fosse ateuda e demanda antre o onrrado padre Dom ffrey ihoanne pela graça de deus Bispo da Guarda e sseu cabido da hũa parte e os juyzes e o Conçelho da Covilhaa da outra ssobre departimentos dos herdamentos que ssom contehudos na carta do Bispo e Dom Rodrigo que aia paraiso que deu aos de Caria por termho assi como ssom demarcados e apeegados contra covilhaa pelo devandicto Bispo e Dom ehoanne e per mor gordo e per joham perez de ssam Pedro coonigos da Guarda … pay domingos e per Dom Salvador e per Apariço paes e per meem ffernandez e per Egas domingos e per outros omens bõos vesinhos de Caria e per Simhõ paes e per Domingos da costa ….. de covilhaa e per Stevam pirez …. dessa meesma e per Pero ….. stevam (?) mercador e per afonso (?) paes e per lourenço paes sseu hyrmao e per Domingos perez arcipreste de covilhaa e per Steve annes priol de valverde e per giral gonsalvis procurador e mamposteiro do Concelho de Covilhaa e per Domingos peres bully buly e per Joham do rroçim e per antom andador do conçelho q֮ forom todos do Conçelho de Covilhaa pera veer e pera apeegar o davandicto herdamento convem a ssaber como parte com o herdamento daparicio paez e en como vay aa pedra da Ervideira e dij como vaym aas ffontes da trepada e deym açima de val longo e dym como sse vay aas çimas das cabeças de val longo e em como vay aas çimas das cabeças da chorroseisa e de si como sse vay ao marco do bregeo e en ao marco velho que esta en çima do val do pereyro na carreira que vay pera o ssalgueiro e assi ao marco que ffes poer o Bispo em essa mesma carreira como vay pera o salgueiro adeante vertente agua contra Caria e o devandicto herdamento apeegado e demarcado perdante os de ssuso dictos açima de todesto de boa voomtade e de boom aprazimento do devandicto Bispo Dom ehoanne e do sseu cabido e dos devandictos juyzes e Conçelho de Covilhaa a tal amjgavel composisom antre ssi convem a ssaber que o devadicto Bispo de ou ffaça dar trinta libras de djnheyros da moeda de portugal que ora corre q֮ ffazem vynte soldos a libra pela ffesta de ssam ehoanne bautista do mês de junho em cada hũu anno ao de ssuso dicto Concelho e noutra parte sse aqueeçer que o devandicto Concelho de Covilhaa enviar atees ssex cavaleiros en seu negocio os omens moradores en Caria sse os devandictos cavaleiros hi fforem pousar devem a dar duas vezes cada hũu anno a esse cavaleiros a comerr em esta maneira que sse ssegue convem a ssaber dous carneiros e oyto gallinhas e campaam …………. e Caria ………. algũu omem (?) que algũa cousa ffizer que aia de sser speitado que os omens de Caria que o despeitem e sse ffezer cousa per que deva a sser justiçado adugãno o Conçelho de Covilhaa que ffaçam e֮ el justiça e os juizes e o Conçelho de Covilhaa outorgam de boa voontade e de boo conssentimento que o devandicto Bispo e sseus ssusseçores e a Egreia de Eidanha aia livremente e en pas e ssen nenhũa contenda aqueles herdamentos sobre los quaes era a demanda pera ffazer en eles e deles o que quiserem assi como fforom apeegados e demarcados e per dante os devandictos coonjgos e dos juyzes e dos homens boons de Covilhaa e per dante os devandictos omens de Caria assi como ssom escritos na carta qual deu o Bispo Dom Rodrigo aos omens de Caria como pera contra Covilhaa e que des aj adiante nom demandemos ao Bispo aa Egreia nenhũa coussa ssobresses herdamentos de ssuso dictos e nos juyzes e Conçelho de Covilhaa devemos deffender os moradores de Caria asi com os nossos vezinhos e quaes coutadas ffezer o Concelho de Covilhaa pera ssy tal ffaçam pera os omens de Caria e qual coutada possem os omens de Caria pera ssy tal ponham pera o Conçelho de Covilhaa e noutra parte os juyses de Caria devem hir cada hũu anno en dia de ssam ejhoanne bautista a jurar em nas maaos dos juyzes de Covilhaa pera comprir todas estas cousas que de ssuso ssom dictos e sse per outra o devandicto Bispo Dom jhoanne ou outro qualquer sseu ssuçessor nom der ou ffezer dar as devandictas trjnta libras ao conçelho de Covilhaa segundo como de ssuso ho dicto concelho de Covilhaa penhora os omens de Caria por ellas e sse algũa das partes de ssuso dicto …… composiçom ou algũa coussa ……. libras …e……………………. todo ssempre e o Conçelho de Covilhaa nom sseriam theudos a demandar mais em nenhũa coussa aos omens de Caria sse nom aquelas que ssom contehudas em esta carta no testemonhio da qual cousa nos de ssuso dictos Bispo Dom ejhoanne e Cabiddo de Eidanha en ssenbra com os juyzes e cõ o Conçelho de Covilhaa ffesemos seer ffecta esta carta de composiçom partida per a.b.c per mão de Domingos gil tabelliom de Covilhaa e seer sseellada dos nossos sseellos pendentes e eu Domingos gil  pubrico tabelliom de nosso ssenhor el Rey en Covilhaa a rrogo e per mandado do devandicto Bispo dom ejhoanne e do cabido de Eidanha e dos juyzes e do Concelho de Covilhaa esta carta partida per a.b.c com minha mão propria escrevj e nela este meu ssinal pugi en testemonho de verdade ffecta esta carta quintaffeira tres andados do mês de Oytubro da Era de mill e tresentos e des e oyto e o procurador do dicto Bispo disse per dante mjm que el nom condizia e compromisso e que o outorgava e que era boo e que assi queria que sse mantevesse mais per diante que lho decrarasse en a qual logar hu dis sseos omens de Caria acharem algũu omem que algũa coussa ffaça per que aia de seer speitado que os omens de Caria que o despeitem e sse ffezer cousa per que deva a sseer justiçado adugãno ao Conçelho de Covilhaa que ffaçam em el justiça e eu esto assi mando que sse os omens de Caria acharem algũu omem que algũa coussa ffez per que aia de sseer speitado que os omens de Caria o despeitem assi como dis em o compromisso e mando que aqueles que fforem presos per rrasom de crime que os tragam aos juyzes e ao Conçelho de Covilhaa que esses juyzes os ouçam e sse acharem que merecem justiça que a ffaçam em elles e sse acharem que nom mereçem justiça mando que os dem aos de Caria assi como sse ata aqui costumou e mando que todalas outras cousas que som contehudas no dicto compromisso que sse compram e  que sse aguardem e nom sseiam nenhũu oussado que as passe en testemonho deste deyem ao Conçelho de Covilhaa esta carta Dante en Santarem tres dias de abril El Rey o mandou per Pero steves e per viçente eannes sseus vassallos joham domingos de porcal a ffes Era de mill e tresentos e çinquoenta e tres annos Pero steves a vjo e vicente eannes a vjo a qual carta mostrada e leuda per mjm ssobredicto tabelliom Domjngeannes mamposteiro do Conçelho de Covilhaa pedio o trasllado dela com meu ssinal testemunhas Domjngeannes stevam domingos juyzes da dicta villa mor  vivas mor annes vicente eannes e outros e eu martim ffernandes ssobredicto tabelliom que este traslado da dicta carta escrevj e en ele este meu ssinal ffis en Testemunho da verdade ffecto ffoy ssesta ffeira vynte e cinquo dias de Julho Era de mill e trezentos e çinquoenta e tres annos.

Nº 16

25 de Junho de 1353 E.

Sabham todos como en pressença de mym mor annes tabaliom delRey en covilhaam e das testemunhas escritas seendo en caria no paaço do honrrado padre e Senhor don Stevam bispo da guarda Dominge anes e stevam dominguez juizes de covilhaam e Domingos johannes mamposteiro do dicto concelho disserom e ffrontarom ao dicto Bispo que lhi ffrontavam pelo dicto concelho de covilhaam que quizesse comprir e aguardar o conpromisso que era fecto antre el e o dicto Concelho per rrazom dos herdamentos de caria assi como era conteudo en hũa carta de sentença de nosso senhor el Rey en que mandava que se conprissem todalas coussas que eram conteudas no dicto compromisso a quall carta hj ffoy mostrada per dante o dicto Bispo e diziam que porque no dicto compromisso era conteudo que en cada hũu ano ffossem jurar os juizes de caria nas maãos dos juizes de covilhaam que aguardassem as cousas que eram conteudas jantares que lhis aviam de dar e diziam que eles lhj frontavam pelo dicto concelho que lhis quizesse comprir as ditas cousas assy como he conteudo no dicto compromisso e assy era julgado antre eles e o dicto Bispo per elRey e o dicto bispo disse que nas coussas en que sse hussara de comprir des Duzentos e de çento e de ssessaenta de vjnte e de dez anos ata o dicto dya deste estormento que teudo era de hussar com elles asy como ssempre hussara mais dizia que a Egreia da Guarda prescrevera na dicta jura e nos ditos jantares contra o dicto Concelho e que a Egreia podia prescrever contra eles  eles nom podiam prescrever contra a Egreia e dizia ao que diziam que era julgado per ElRey que se conprisen todalas coussas que eram conteudas no dicto compromisso dizia o dicto Bispo ca non era sentença ca na dicta carta delRey non dizia julgo mais que dizia mando que a contenda nom fora antre ele e o dicto conçelho se nom sobre aquela causula em que diz o compromisso que sse algũu omem for achado que meresse a justiça que o levem a Covilhaam e se ffor espertadojro que o espejtem en Caria e por que nom decrarava hu se devya douvir que sobre aquela cassula ffezer a el seu protador e que lhy nom dera el poder se nom sobre la dicta casula e que nosso Senhor ElRey decrarara a dicta casula assy como fora ssa merçee e dizia que xi lhj nom tolhia sobrelas outras cousas a deffender o seu dereyto e dizia que porque nunca ffora hussado antre eles as dictas coussas des que o compromisso fora feyto e ora novamente vjnhamdes a demandar as dictas cousas as quaes ele dizia que prescrevera contra eles pasa per vynte e ………. Sentença a nos pouco mais ou pouco menos dizia que o demandas….. seu juiz e que el deffenderia o seu dereyto ca teudo era el de hussar com eles assy como sempre hussara antre que o compromisso fora feyto e depois que compromisso ffoy ffeyto e os ssobredictos juizes e o ssobredicto manposteyro do dicto Concelho disser que o sseu portador do dicto Bispo que era abastosso e que assy dava en ElRey ffe na dicta ssa carta e que sobre todalas coussas que som conteudas no dicto compromisso ssom julgadas que sse guardem assy como no dicto compromisso ssom conteudas e dizia que no que dizia o dicto Bispo que prescrevera contra eles diziam que por se soffrer o dicto concelho o entendendo que faziam amor a algũus sseos antesseçores que sse nom tolhia porem de sse aguardarem pois conteuda ssom no dicto compromisso por quaes ele e os de caria lhj ssom obrigados polos sseus herdamentos que lhj o dicto concelho dera e o dicto Bispo dizia que o dicto concelho contendera demanda sobrelos dictos jantares com nos de caria e que el Rej assolvera os de caria e condenara o dicto concelho em hũa ssoma de custas e que sse os quissessem demandar que lhjs pagassem as custas e entom que os demandassem e dizia mais que el lhis mostraria cartas ssuas do dicto concelho perque lhj nom ffazessen força e ffirmadas per ElRey e que sse o quissessem demandar por algũu dereyto que contra el entendessem que o demandassem per direyto e os dictos juizes e manposteyro disserom que eles hj ffrontavam porque per demanda o aviam vençudo per ElRey ssegudo era conteudo na dicta ssa carta da ssentença que o quissesse conprir senom que pidiam a mjm sobredicto Tabaliom que lhes desse em este  testimonjo que ffecto ffoy em caria vynte e çinquo dias de junho da Era de mil e trezentos e çinquoenta e tres anos testemunhas Stevam pires juiz de ssan viçente e pero eannes dicto murganho e pero annes que ffoy freyre e Ramiro migueez coonigo da guarda e Mor annes vogado e outros moytos E eu mor annes sobredicto Tabaliom que este testimonyo escrevy e este meu ssynal fiz que tal he. (4)
(Continua)

Notas dos editores
1) Tem sido referido que Caria, concelho de Belmonte, recebera foral de D. Manuel I. Ora o foral outorgado por este rei em 15 de Dezembro de 1512 diz respeito a Caria, couto e mosteiro das Çarzedas, da comarca e correição de Lamego em 1537. (In Luiz Fernando Carvalho Dias, "Forais Manuelinos do Reino de Portugal e do Algarve", volume Beira na nota 60, página 219) 
 
2)https://covilhasubsidiosparasuahistoria.blogspot.com/2012/10/covilha-os-tombos-i.html 
3)Monografia de João Macedo Pereira Forjaz: https://covilhasubsidiosparasuahistoria.blogspot.com/2013/12/covilha-memoralistas-ou-monografistas-v.html