Continuamos a publicar documentos do
século XIX relacionados com a reforma dos Forais. Luiz Fernando Carvalho Dias deixou-nos vários
estudos e algumas reflexões sobre o assunto.
[…] “A
carta régia que em 1810 abriu caminho aos estudos da Reforma dos Forais começou
a ser executada em 1812 e da Comissão faziam parte João António Salter, que
presidia, Trigoso e mais dois canonistas, um dos quais João Pedro Ribeiro.
Informa Trigoso que a carta régia de inspiração de D. Rodrigo de Sousa
Coutinho “não tinha outro fim mais que paliar a funesta impressão que
haviam de fazer” os tratados com a Inglaterra, tão prejudiciais à nossa
indústria, que o mesmo Ministro assinara então. Destinava-se ainda a procurar o
meio de “fixar os dízimos, minorar ou alterar o sistema das jugadas, quartos e
terços, fazer resgatáveis os foros e minorar ou suprimir os foraes” […]
O liberalismo é um momento importante no
sentido desta mudança, pois, como dizia Melo Freire substituir os forais era
tão urgente como o Código Político. No entanto as opiniões divergiam, embora
haja passos importantes que não podem ser esquecidos:
-
Já do Rio de Janeiro, numa Carta Régia de 1810
dirigida ao clero, nobreza e povo fora ordenado aos governadores do Reino que
tratassem dos meios “com que poderão minorar-se ou suprimir-se os forais, que
são em algumas partes do Reino de um peso intolerável”.
-
Em 1811, a Mesa do Desembargo do Paço expede ordens
para que os corregedores das comarcas averiguem esse peso dos forais.
-
Em 17 de Outubro de 1812 a
Regência cria a Comissão para Exame dos Forais e Melhoramentos da Agricultura.
-
Em 1815, D. João volta a querer que
se investigue sobre “os inconvenientes que da antiga legislação dos forais
provinham ao bem e aumento da agricultura”.
-
É já nas Cortes Constituintes, em 1822,
que é promulgada a chamada “redução dos forais”.
-
A contra-revolução miguelista, em 1824,
revoga as anteriores medidas.
-
Marco essencial é a reforma de Mouzinho da Silveira (1832) em que desaparecem os foros, censos, rações e toda a
qualidade de prestações sobre bens nacionais ou provenientes da coroa, impostos
por foral ou contrato enfitêutico. Na verdade o governo de D. Pedro pretendia
fazer uma revolução da agricultura e social que atingisse a nobreza, o clero,
os municípios, os desembargadores, os donatários, tomando medidas como:
extinção dos morgadios e vínculos que não ultrapassassem os 200000 réis de
rendimento líquido anual; supressão das sisas sobre transacções; extinção dos
dízimos; nacionalização dos bens da Coroa e sua venda em hasta pública.
-
A reforma continua pelo século XIX.
Covilhã Fotografias de Miguel Nuno Peixoto de Carvalho Dias |
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(Sobre o Direito de Propriedade no uso dos pastos comuns)
Senhor
Em 16 de Dezembro do
ano proximo passado propoz a V.A.R. esta comissão que era muito necessario para
o bem geral da Agricultura firmar solidamente o precioso direito de
propriedade, proibindo o uso dos pastos comuns nos terrenos particulares (jus
compascui; servitus pascendi), permitindo as tapadas e removendo os obstaculos
que a estas se opoem, sujeitando finalmente alguns §§ da suspensa lei de 9
de Julho de 1773 que pareceram muito conducentes para facilitar aos
proprietarios o livre uso do que é seu.
Ainda
que a Comissão esteja muito certa nos principios que então fundaram a sua
proposta não foi contudo de sua intenção (nem a matéria o pedia) examinar a
referida Lei de 1773 em toda a sua extensão e generalidade mas só naquela parte em que podia auxiliar as tapadas e uniões das
fazendas.
Considerando porem agora com toda a
reflexão a dita Lei em cada uma das suas partes, e tambem a utilidade publica
que dela se pode ou não seguir no estado actual da nossa agricultura, julgou a
Comissão que deveria outra vez voltar a este assunto para que não parecesse
por um lado que ela reputava dignas de serem indistintamente renovadas todas as
disposições da referida Lei Agraria e para que por outro lado se não pudesse
opor que os §§ cuja renovação se propõs como necessária, tinham contra si os
mesmos obstaculos que em outro tempo havião feito suspender esta Legislação.
Na
verdade assim como se não pode dizer que fosse obra do acaso, ou menos
consideradamente ordenada uma Legislação fundada em tão solidas razões de
interesse publico, como são aquelas que se expendem no sabio preambulo da Lei
de 1773; assim tambem se devem resputar muito atendiveis os motivos que derão
causa ao Decreto de 1778 que o suspendeo. Estes motivos são conhecidos: pretendeu-se
cavilar e defraudar a referida Lei com avaliações absurdas e conflitos de
jurisdição inadmissiveis, segundo é expresso no principio do Alvará de 14 de
Outubro de 1773; e a desordenada cubiça e orgulho de muitas pessoas
(segundo se explica o Decreto de 1778) preverteram os seus justos fins.
Portanto
a referida suspensão longe de atacar o objecto da Lei a qual reputa justos só
teve por fim fazer cessar os inconvenientes que dela se seguiam, em quanto com
mais exacta averiguação se não examinava o modo porque ficando ela subsistindo
se poderiam remover as duvidas e os embaraços que sobre a sua inteligencia e
execução se agitavam. É este exame, tão
dificil como complicado o que a Comissão leva à presença de V.A.R. considerando
de per si cada uma das partes da Lei e as modificações de que esta é
susceptivel e tambem o modo de facilitar a sua execução.
Primeira Parte
Quanto aos edifícios
Ainda
que a disposição dos proprios tres §§ da Lei se pudesse omitir por isso que não
tem relação alguma com a Agricultura contudo devendo-se ela contemplar como
tendente a firmar o direito de propriedade destes predios não será inutil
reflectir que as grandes vantagens publicas e particulares que resultam da
adjudicação dos predios rusticos, não resultam da adjudicação das porções dos
edificios; por isso nesta parte se mostra demasiadamente rigorosa a Lei
emquanto manda decretoriamente fazer as adjudicações no caso do § 1º excluindo
inteiramente o arbitrio dos diversos proprietarios, aos quaes pode não fazer
conta alguma esta adjudicação; principalmente nas circunstancias actuais em que
pela ultima invasão os proprietarios de casas da Prov.ª da Estremadura ficaram
com os seus predios em tal ruina que a renovação de uma lei que os obrigasse a
comprar ainda outros predios ou a perder os seus antigos, os redusiria à ultima
consternação.
Parece portanto à Comissão que não só pela
razão geral do pouco interesse que comummente acha um proprietario em
acrescentar inutilmente as casas que habita mas pela razão particular
deduzida das actuais circunstancias devem reduzir-se os referidos §§ da Lei a
estes precisos limites: 1º) que as pessoas que de novo quiserem edificar casas
ou reedificá-las nas cidades ou vilas notaveis do Reino as possam ampliar pelas
pequenas porções de terrenos e domunculas encravadas ou contiguas no
espirito da Lei de 12 de Maio de 1758; sendo isto feito nos mesmos casos
e com as mesmas avaliações e excesso delas que abaixo se declaram a respeito da
adjudicação dos predios rusticos encravados ou contiguos. 2º) Que as casas
nobres, i. e. aquelas de que fala o § 3º não possam mais dividir senão em
quartos e não em andares de maneira que cada proprietario fique sobre si e sem
dependencia alguma do outro assim lhe seja livre fazer todas as obras que
julgar uteis na parte do edificio cujo dominio lhe pertence. 3º) Que quando as
ditas casas nobres se acharem divididas em diferentes possuidores, se tire
qualquer obstaculo legal que possa haver para que as diversas porções se
adjudiquem a um só dos proprietarios, uma vez que todos eles convenhão nessa
adjudicação, e regulando-se este caso de adjudicação voluntaria (quanto à
natureza destas porções e encargos a que estão sujeitas) pelo que se determina
nos casos das adjudicações necessarias dos predios rusticos.
Quanto à encravação e contiguidade
O
§ 4º desta Lei foi o primeiro dos que a Comissão julgou na sua proposta que deviam ser instaurados; e
com efeito a sua utilidade é tão claramente demonstrada que não se pode
assignar uma razão solida que sirva de obstaculo a fazê-la reviver. Pelo menos
parece que não deve subsistir a declaração do Decreto de 17 de Julho de 1778
em quanto permite a adjudicação dos predios que jé estivessem encravados ao
tempo da promulgação da lei, nos casos em que o predio encravado não excedesse
a quantia de 200$000 rs. e não tivesse igual ou maior valor que aquele em que
se achasse encravado: pois que 1º) para
o bem geral da agricultura tão necessaria é hoje a providencia da lei a
respeito dos predios encravados antes dela como dos que o forem posteriormente.
2º) é evidente à vista da mesma Lei e da razão em que ela se funda que nunca o
predio encravado se pode reputar de igual ou maior valor do que o terreno
principal; o que só poderia acontecer n’algum caso não cogitado que por
isso mesmo não deve ser precavido pela Lei nem constitue uma excepção dela;
tanto mais que por semelhantes cousas que podem ocorrer e não prevenir-se é que
ficou salvo as partes no caso de se sentirem gravadas, o recurso para a mesa do
Desembargo do Paço segundo o § 3º da Lei. 3º) O caso que o Decreto acautela e
em que permite consulta, isto é, aquele em que haja algum predio de maior
valor, e que ainda assim a respeito da propriedade em que está metido se possa
considerar de menor importância; deve entrar igualmente na disposição geral da
Lei que com razão quiz facilitar a execução destas adjudicações pela utilidade
que daí resulta; e não demorá-las com maior encomodo e gravame das partes. E
também a respeito dos predios contiguos parece que não deve subsistir a
declaração do Decreto de 1778 por quanto a Lei de 1773 definiu
com bastante clareza os casos em que a adjudicação deles devia ter lugar, e os
considerou mais pelo lado do benefício da agricultura do que pelo do decoro e
formosura dos Edificios e fazendas que só teve em vista o referido Decreto.
Mas
se estas declarações podem julgar-se desnecessárias, outras se poderiam fazer
afim de evitar quaesquer duvidas que ocorram sobre a sua inteligencia. Assim a
Lei deveria definir o que se deva entender por predio encravado e contiguo; e
deveria tambem mandar adjudicar por menor preço aquele do que este visto que
qualquer proprietario pode menos usar do seu terreno tendo outro incluido nele,
do que tendo-o só unido ou pegado. Portanto
parece à Comissão: 1º) que se deve declarar legalmente predio encravado não só
aquele que por todos os lados está incluído no terreno principal, mas também
aquele que está unido ao dito terreno por muitos lados, comtanto que não haja
por ele constituida outra serventia, que não seja pelo mesmo predio com quem
confina. E por predio contiguo deve-se declarar aquele que posto tenha
serventia por estrada ou caminho publico ou particular da povoação, contudo
está unido por dous lados ao terreno principal; ou ainda por um, no caso
somente de fazer grande deformidade e de tornar irregular a propriedade nobre a
que está contiguo. 2º) que suposta esta inteligencia pede a justiça e a
equidade que o proprietário que requere a adjudicação do terreno encravado
pague a quarta parte alem da avaliação, e que pague a terça parte alem da
mesma, o que pede a adjudicação da terra de contiguo.
Quanto à integridade dos casaes
Os
§§ 5 e 6 que mandou conservar em toda a sua integridade os casaes e terras das
lezirias, considerados absolutamente podem parecer como conformes à justiça e à
liberdade natural do domínio e por isso é preciso que se fundem em uma razão
tão justa e tanto de utilidade geral que vença a razão do legítimo direito que
deve ter todo o proprietario de usar livremente dos seus bens; e esta razão
expressa no principio da lei e por certo verdadeira no infelis e actual estado
da nossa Agricultura, demonstra claramente a necessidade desta providencia
legal sem a qual bem depressa os casais importantes e lezirias ficam
aniquilados e os filhos coherdeiros por quem fossem repartidos, privados dos
meios de subsistencia.
É verdade que até certo ponto já outras
leis tinham acautelado a integridade dos casaes porquanto nos que são
emprazados (e destes é o número maior em todo o Reino) não pode o enfiteuta
alhear terra alguma; nem tão pouco podem os mesmos prazos entrar no juiso
divisorio entre coherdeiros podendo-se só dividir a sua estimação. Aplicadas
agora estas leis aos casais e lezirias não emprasados os quaes quere a lei que
permaneçam na sua integridade, não só fica subsistindo a divisão por estimação
entre os coherdeiros como nos prasos mas tambem um dominio mais livre e
absoluto de que o que compete ao enfiteuta, o qual nem pode vender sem
consentimento do Senhor directo nos termos da lei nem pode dispor do prazo
senão conforme a ordem da sua investidura: donde não se pode com verdade dizer
que seja o efeito daquela integridade legal ficarem os casaes livres reduzidos
a outros tantos vinculos ou prazos.
Mas a razão da grande utilidade publica e
bem geral da agricultura que exige imperiosamente esta providencia é a mesma
que pede a modificação num caso em que ela não poderia produzir aquele bem nem
ser de algum modo util ao interesse dos proprietarios o que sucede quando
algumas terras do casal estão dispersas e distantes daqueles sítios em que
estão as casas e as terras principais dele: neste caso parece que deve ser
livre ao dono do casal vender as ditas terras dispersas em diferentes sítios,
sem que seja obrigado a reintegrar o casal com outras terras iguais, nem tão
pouco a depositar o preço que recebeu (quando essas terras fossem encravadas em
predios alheios) até achar outras em que se verifique a dita união.
E
a razão desta modificação é mui clara e digna de ter sido atendida pela lei;
pois que se a utilidade que o publico e o particular tira da integridade dos
casaes em quanto unidos e constituindo um só todo. é a que suspendeu o efeito
natural e civil do domínio; não se verificando aquela utilidade em terras
separadas em tal distancia que não possam comodamente ser vigiadas por seu dono
ou unidas debaixo duma só administração; segue-se que em tal caso deve reviver
o absoluto e pleno dominio, permitindo-se a desmembração dos ditos terrenos:
nem disso se pode seguir prejuiso algum; 1º) porque os terrenos assim alheados
vão dar um maior valor aos outros casaes a que ficam pertencendo aos quais mui
naturalmente estariam unidos e contiguos quando não estivessem encravados. 2º)
porque os donos dos casaes desmembrados podem empregar o preço da venda em
benfeitorias com as quais as terras restantes subam muito de valor o que não
sucederia ou ficando o dito preço em depósito, ou conservadas as terras que
pela sua distancia não poderiam ser bem amanhadas nem produzir interesse algum.
E tão solido parece a referida excepção da
providencia da Lei que a Comissão não duvida aplicá-la pelo bem da agricultura
àqueles casaes que constituem praso por mais que seja individua a natureza
do contrato da enfiteuse; de tal maneira que não só o enfiteuta possa
enfiteutar com licença do Senhor directo as terras do praso que ficarem
distantes da parte principal dele, mas que o Senhor directo possa fazer delas
diverso praso.
E
como a malícia dos homens é capaz de preverter os fins das melhores leis e a
palavra distância, tantas vezes repetida, pode oferecer uma significação
equívoca e dar causa a que o dono dum casal alheie uma terra pela razão de não
estar unida e contígua às outras / o que nunca ou quasi nunca pode acontecer
num casal de consideravel extensão; julga
a Comissão oportuno que se declare permitido o distrate das terras que estão em
distância tal que prudentemente se julgue não poderem andar unidas debaixo de
uma só administração nem amanhadas pela mesma pessoa que cultiva as outras
terras do casal.
Quanto aos predios entresachados
O
§ 7 da Lei que comtempla o caso dos predios entresachados é de uma utilidade
tão evidente que é escusado muito aparato de razões para a demonstrar. Com
efeito sem se pôr em prática a sua disposição, não se podem tapar as fazendas
nem reduzir a estado de boa cultura pois que umas são obrigadas a dar serventia
às outras e é quasi sempre necessario que sejam administradas por um Rendeiro
ou feitor, o qual muitas vezes pode não ser da aprovação de todos os donos
desses prédios; Em geral é do interesse dos proprietarios e dos rendeiros
cuidarem muito em conseguir a contiguidade dos seus campos e ainda que alguns economistas tenham por um projecto quimérico
pretender a união de todas as terras de uma herdade ou de um casal pela
dificuldade que teem as permutações ou as compras, as quaes obrigam a grandes
sacrificios àqueles que as propoem; contudo nem por isso se deve perder
inteiramente de vista este objecto tão necessario, e cuja execução se torna mui
facil no caso de que fala o § 7 da Lei visto que as permutações são feitas
entre proprietarios que teem as suas fazendas no mesmo sítio e que teem igual
vantagem na sua união.
Suposto isto parece à Comissão que não só
se deve restituir à sua inteira observância o § de que se trata de maneira que
qualquer das partes possa requerer a união, ainda contra vontade da outra;
mas tambem por identidade de razão se deve estender a sua disposição a outros
prédios que não sejam Lizirias ou grandes campos, mas sim courelas de vinhas ou
de olivais ou terras de diversos casais, as quais comummente se acham
confundidas e entresachadas.
Quanto aos §§ seguintes da Lei
É
escusado falar particularmente nos §§ 8 e 9 e 10 os quais são uma consequencia
dos antecedentes e neles se devem julgar incluídos; o 1º obsta ao principal
abuso que a Lei quiz sabiamente coibir proibindo a repartição dos fundos de
terras por glebas. Em outro lugar são demonstrados mais extensamente os inconvenientes
que se seguem ao Estado, à cultura geral e particular destes prédios,
excessivamente diminutos.
Os
§§ 11 e 12 foram com razão conservados em todo o seu vigor pelo Decreto de
1778 e a execução do segundo foi ampliada pelo Alvará de 11 de Março de 1796 a respeito dos
atravessadouros e serventias inuteis que decorrem ao longo das estradas novas.
Assim os referidos §§ e ampliação devem subsistir menos na parte em que o
citado Alvará comete este negocio ao Superintendente geral das estradas, o qual
já hoje não existe, e ainda quando existisse seria gravame para os povos
requererem perante um Magistrado que estivesse tão remoto do lugar das suas
habitações e propriedades.
Quanto aos colonos parciários das herdades
do Alentejo:
O § 14 da Lei
(do qual o 15 é uma ampliação e consequencia) funda-se em tão sólidos e
verdadeiros principios que a sua suspensão foi com razão considerada por um
benemérito escritor // O Dr. Antonio Henriques da Silveira (1)// como uma das causas da decadencia e
ruina da Agricultura do Alentejo. Sendo, por isso, inutil qualquer demora em
ilustrar mais este objecto, julga a
Comissão que é do seu dever ponderar que a adjudicação dos diferentes quinhões
ao Senhorio ou Posseiro se torna demasiadamente gravosa para este, emquanto é
obrigado a pagar prontamente o preço dos quinhões, para o que é ordinariamente
preciso um considerável desembolso ou sofrer que a sua herdade seja vendida em
hasta pública, ficando privado do seu domínio e posse.
Esta demasiada
dureza da Lei pode-se facilmente tirar, uma vez que se adopte o arbítrio
proposto pelo mencionado escritor, segundo o qual deve ficar no arbítrio do
posseiro ou pagar logo de uma vez o preço da avaliação dos quinhões ou receber
estes, sendo obrigado a pagar aos antigos quinhoeiros uma pensão anual certa e
determinada e que não exceda o juro legal da estimação do quinhão; podendo o
posseiro a todo o tempo que lhe seja possível ou cómodo distratar esta dívida a
que está obrigado pagando por uma vez o capital da dita estimação.
Este arbítrio de reduzir os quinhões das
Herdades à natureza das estimações como se pratica na divisão do valor dos
prasos, é igualmente favorável ao Posseiro e aos quinhoeiros, e por ele se
consegue plenamente a observância e o bom efeito da lei.
Quanto à divisão dos prasos entre
coherdeiros
O uso ou abuso particular da Provincia do
Minho em virtude do qual se dividem os prasos corporalmente pelos coherdeiros,
encabeçando-se num, alem de ser proibido pela Lei geral do Reino no liv. 4
Tit. 36, § 1 e Tit. 96 § 23, e especialmente em relação àquela provincia
pela sábia lei do Snr. D. Pedro 2º de 6 de Março de 1669 (?) em
resolução da representação dos Procuradores da Cidade do Porto nas Cortes de
1641, 1653 e 1668, é diametralmente
oposto ao bem geral da agricultura e produz os mesmos inconvenientes que a
Lei do Snr. D. José pondera a respeito da divisão dos fundos de terras por
glebas: de maneira que é uma cousa inaudita e sumamente escandalosa
conservar-se até aos nossos dias um semelhante abuso com manifesta infracção
das nossas Leis.
Poderia à
primeira vista parecer estranho que os senhores directos a quem a mencionada
Lei do Snr. D. Pedro 2º (?) supõe mais prejudicados nas divisões dos prasos
(porque ali se lhes originava a confusão e diminuição dos seus foros e maior
dificuldade na arrecadação deles) fossem a-pesar disso os que mais promoveram e
facilitaram essas divisões; ou prestando simplesmente a sua autoridade e
consentimento aos varios contratos e transacções porque elas se efectuarão ou
passando a titulá-las, fazendo renovações separadas dos prasos de todas ou de
algumas das mesmas porções desmembradas, conservando-lhes a forma das antigas
investiduras e ainda alterando-as em todo ou em parte; ou finalmente incluindo
na renovação e vedoria de diverso praso pertenças de outros prasos seus que o
enfiteuta ou seus passados já possuiam, declarando-se apenas que aqueles
predios foram pertenças de tais e tais prasos, e que não fizesse dúvida irem
incluidos na actual vedoria por serem todos do mesmo senhorio directo e se
acharem possuídos pelo mesmo enfiteuta.
Cessará
contudo a sobredita estranheza uma vez que se advertira que muitas vezes os
senhores directos, especialmente os corpos de mão morta, recebiam interesse
destas divisões 1º) pelo costume tambem abusivo do acrescentamento dos foros
por ocasião das mais frequentes renovações dos prasos assim subdivididos em
terças e quartas partes ou ainda em menores porções de casaes. 2º) pelas
lutuosas e laudemios, sendo certo que com a mesma frequencia percebiam os senhores
directos estes direitos eventuais, achando-se os primitivos casais e prazos
subdivididos e titulados em mais pessoas e vidas que falecessem ou pudesse
fazer alienações voluntárias ou necessárias.
A Comissão demorou-se mais tempo em
considerar a actual confusão a que se acham reduzidos os casaes ou prasos
originais da Provincia do Minho para mostrar que por muito que ela seja nociva
ao bem público e repugnantes às disposições das leis; não seria prudente (ainda
que fosse justo) sujeitar a inteira observancia da primeira parte do § 28 da
lei de 1773; pois que isto acarretaria uma tal aluvião de litígios que por
se processarem e decidirem não bastariam quantos auditorios e Tribunais há
naquela Provincia e em todo o Reino; como já por triste experiência se ia
conhecendo no intervalo do tempo que decorreu desde a data daquela Lei até o
anno de 1778 em que foi suspensa.
Não podendo portanto sem gravíssimos
inconvenientes verificar-se já a total reintegração dos prasos originarios,
segue-se que se deve esta promover-se por meios indirectos, posto que mais
morosos. Assim parece à Comissão de que devem ser absolutamente proibidas
quanto ao futuro todas as desmembrações de prasos feitas contra o espírito e a
letra da Ordenação e Leis do Snr. D. pedro 2º e do Snr. D. José, debaixo de
pena de nulidade ou ainda de outras mais graves quais são as que se expressão
no § 5 da Lei de 1773 excepto somente os predios muito distantes na
forma sobredita = Quanto à integridade dos cazais = ficando contudo salva a
divisão dos mesmos prasos por estimação na forma da Lei do Reino. E quanto ao
pretérito deve-se fazer a reunião dos prasos desmembrados somente nos casos
seguintes: 1º) no de encravação ou contiguidade com terrenos do mesmo praso
segundo as regras prescritas para os outros predios encravados ou contiguos;
pagando-se neste caso ao possuidor do praso encravado ou contiguo o preço da
louvação do dominio util com o correspondente excesso e ficando o Snr. Directo
privado do laudémio, até porque nesse caso lhe não compete o direito de opção.
2º) nos de venda necessaria ou voluntaria das porções que andam desmembradas
quando esta tenha de realizar-se em todo ou em parte, facultando-se ao
possuidor da maioria do prazo ou ao possuidor da porção contigua ou mais
proxima àquella que se vende, o direito de prelação e com exclusiva expressa do
direito de opção do Snr. Directo. 3º) no de consolidação por qualquer motivo
que seja do dominio util dos prasos menores e desmembrados com o dominio
directo; sendo neste caso os senhores directos obrigados a reunirem estas
porções ao praso maior ou ao contiguo e mais proximo a elas, sem aumento de
cada um dos foros ou pensões. E em todos estes casos se deverá observar a
reunião proposta ainda que o terreno desmembrado andasse já de muito tempo em
titulo de renovação separada.
Quanto à extensão da Lei às diversas
Provincias e à diversa natureza dos predios.
Tem a Comissão
até agora considerado de per si cada um dos §§ da Lei de 1773 que contem
diversa e particular legislação, e tambem tem apontado as diversas modificações
de que eles são susceptiveis afim de produsirem um bem geral e permanente.
Conhecendo-se pois que a Lei assim declarada e modificada dará um grande
impulso à nossa agricultura e tirará grande parte dos obstaculos que se opoem ao
seu melhoramento pode-se reputar superflua e excessiva a cautela de a
considerar separadamente em relação às nossas diversas provincias; sendo antes para preferir o propô-la em
geral para ter observancia em todo o Reino com a declaração expressa no fim do
§ 29 de que movendo-se duvidas sobre a aplicação das suas disposições, nos
casos ocorrentes se dê conta dessas duvidas a V.A.R. pela Meza do Dezembargo do
Paço para nela se decidirem como direito fôr. É evidente que estes casos
sendo exorbitantes e fora da ordem geral, não podem ser individualmente
acautelados pela Lei nem considerados pela Comissão.
Pela mesma razão da utilidade geral que
desta legislação se deve seguir, conhece-se que ela se deve estender não só a
todas as Provincias do Reino mas tambem a todos os predios e terrenos de
qualquer natureza que sejão e especialmente aos da Coroa e ordens, segundo foi
já determinado por uma Ref. (Resolução?) Regia do 1º de Março de 1775.
Nota dos editores 1) Dr. Antonio Henriques da Silveira, cap. 11 do seu Racional Discurso sobre a Agricultura e População da provincia do Alentejo, impresso no Tom. 1 das Memorias Economicas da Academia Real das Sciencias de Lisboa.
(Continua)
Nota dos editores 1) Dr. Antonio Henriques da Silveira, cap. 11 do seu Racional Discurso sobre a Agricultura e População da provincia do Alentejo, impresso no Tom. 1 das Memorias Economicas da Academia Real das Sciencias de Lisboa.
Fonte - BNP Reservados
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Publicações anteriores sobre forais:
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