domingo, 10 de novembro de 2013

Covilhã - As Cortes VII


    Continuamos a publicar documentos do espólio de Luiz Fernando Carvalho Dias sobre Cortes que tiveram a participação de procuradores do Concelho da Covilhã.
    Cortes são assembleias constituídas pelo clero, nobreza e representantes do povo, convocadas e presididas pelo Rei para resolver assuntos especiais. Os três estados do reino ter-se-ão reunido pela 1ª vez em Leiria, em 1254, ou no ano anterior na opinião do Professor Marcello Caetano. Antes desta data a Cúria Régia, que podia ser normal ou extraordinária, não tinha a presença do 3º estado. Os procuradores às Cortes – Homens-bons dos concelhos, eleitos – eram convocados e levavam os agravamentos, artigos, capítulos especiais, ou particulares, ou gerais ao Rei, esperando uma resposta deste.
   Hoje continuamos com a publicação de “capitulos especiaes e varios requerimentos da Villa da Covilhã” e capítulos dos mesteres da vila, oferecidos nas Cortes de Lisboa de 1646 ao Rei D. João IV. É curioso verificar-se a referência, quer nos capítulos, quer nas respostas régias, a outras Cortes, como as de 1641, já apresentadas neste blogue.


Lisboa - A Sé vista do Arco da Rua Augusta
Ano de 1646
Cortes de Lisboa.
Capitulos especiaes e varios requerimentos da Vila da Covilhã, oferecidos nas ditas Cortes ao Senhor Rei D. João 4º.
  Vossa Magestade fez mercê aquela Vila de lhe conceder houvesse mercado dentro da dita Vila todas as semanas. Pedem a Vossa Magestade seja às segundas-feiras, e que seja franco em tudo e que se declare pela Postila que está passada pelo alvará.
2º. Que as fintas que forem por provisões de Vossa Magestade à cidade da Guarda como cabeça que é da comarca se não repartam sem que da dita vila vão assistir a elas duas pessoas da dita vila, eleitas pela camara da dita vila e, sem isso, senão executem as ditas fintas.
. Que haja recebedor das sizas perpetuo, salariado cm camara, como o há nas mais cidades e vilas deste reino.
4º. Que não haja privilegiado para os encargos que forem lançados para a cobrança da fazenda real ainda que sejam privilegiados por contrato ou por outra qualquer via que seja pelos muitos que há.
. Em a dita vila da Covilhã há tesoureiro do concelho e muitos se escusam por privilegio que teem: o que pedem a Vossa Magestade é que os ditos tesoureiros se não possam escusar ainda que tenham privilegios.
. Que naquela vila vá assistir o alcaide mór dela que é Afonso Furtado deMendonça pela quietação dela, e dar ordem a acudir aos rebates dos inimigos de que cada dia somos combatidos.
7º. Que aquela vila está em posse imemorial de em ela haver rendeiro das penas, arrendado pela camara, na qual renda Vossa Magestade terça, e ora o corregedor, indo por correição à dita vila, mandou mandados pelo termo, lhe não obedecem nisto os juizes dos lugares e,indo o rendeiro a alguns lugares, os ditos lugares se levantaram contra o dito rendeiro de modo que se veio fugindo e, se não fugira, o ouveram de matar e ao jurado que consigo levava, e ia cobrar a fazenda de Vossa Magestade: o que se pede é que Vossa Magestade nos conserve na posse em que a dita vila de Covilhã está em ter rendeiro das penas, mandando aos corregedores se não entremetam, e o dito rendeiro, nem em cousas tocantes à dita renda, no que aquela vila e camara receberão mercê.
8º. Que Vossa Magestade mande ao general e alcaide mór não obrigue a gente da ordenança ir às fronteiras por quanto pagam e contribuem assim com as decimas como com o mais que se lhe pede no que receberá mercê. Manuel Mendes Paes. Pedro Cabral.
Capitulos dos mesteres da dita Vila.
Dizem os mesteres da vila da Covilhã, em nome do povo que nas Cortes passadas fizeram a Vossa Real Magcstade suas advertencias e apontamentos por um seu procurador de que tiveram alguns nestas despachos, contudo nestas por ficarem com maiores empenhos para o serviço de Vossa Magestade pois veem que sua real clemencia se não digna de lhes fazer mercê,fazem outros de que esperam despacho por terem deles muita necessidade e serem em proveito e utilidade do dito povo os quaes apresentaram a Vossa Magestade os procuradores eleitos para estas Cortes que são os seguintes.
lº. Primeiramente a conservação e aumento da dita vila consiste em uma legua de terra que está do rio Corges adentro aonde os moradores dela teem seus olivaes, pomares, vinhas, soutos, chãos de regadia em que semeiam pão, trigo, ccnteio, milho, cevada e todos os mais legumes de que se sustentam os mais moradores da dita vila, com os frutos que dão, por ser sitio muito fertil, e se lhes faltarem, sem duvida perecerão, e porque na dita vila há muitos homens poderosos que com seus gados entram no dito sitio e comem os ditos frutos, e sobre os donos das fazendas as defenderem aconteciam muitas dissenções, ferimentos e mortes, e pouco temor de justiça como tem acontecido ameaçarem os meirinhos e alcaides e espancarem quadrilheiros e porteiros quererem encoimar os ditos gados, ordenaram fazer, como fizeram em camara da dita vila, posturas que os Senhores Reis passados lhas confirmaram por um alvará que tem registado na dita camara em que diz que todo o rebanho de gado de unha fendida que for achado no dito sitio pague de coima oito mil reis e que qualquer pessoa o podesse matar, achando-o no dano em fazendas alheias o podesse qualquer pessoa encoimar por si e em fazenda sua, com uma testemunha, posto que seja criado seu, sob a dita pena dos oito mil reis, e que o pastor fosse degredado para os coutos de Castro Marim, e perdesse as armas que trouxesse,e que das coimas que dessem os vereadores fossem as condenações para eles.
. E porque ainda assim os poderosos desta vila com seus gados não deixam de lhes destruir as ditas fazendas, e não são guardadas como convem e é razão, e porque as pessoas que trazem os ditos gados são os mais poderosos da terra e os que a governam por si e seus parentes e ainda que os vereadores lhas encoimem, e lhes são julgadas, as não levam, nem executam por respeito e por esperarem deles lhes façam o mesmo quando servirem os ditos cargos o que não será assim se a pena dos oito mil reis for aplicada ao encoimador e a Vossa Magestade por partes iguais e se os vereadores que servirem e procurador do concelho e escrivão da camara, mesteres, que tambem servirem, forem obrigados a encoimar e guardar a terra com cuidado e vigilancia e se Vossa Magestade houver por bem que os corregedores quando forem à dita vila devasem dos que o contrario fezerem e forem remissos e negligentes na guarda dela, e se as coimas dos coutos forem lançadas em livro separado, e os juizes e almotacés não conheçam delas por não haver lugar de quita e que os procuradores da comarca as cobrem como fazenda de Vossa Magestade e finalmente que os rendeiros das rendas do verde não tenham parte nelas por não terem diminuição alguma. Deve Vossa Magestade mandar que não tão somente se lhes confirme o dito alvará e postura mas que o extendão da maneira que se contem neste capitulo porque nisto fará Vossa Magestade grande mercê ao dito povo meudo e ainda a todos em geral.
3º. Esta vila da Covilhã é uma das notaveis deste reino, e tem vinte e quatro homens dos melhores do povo dos quais muitos veem ser almotacéis, e nela se enlegem cada um ano dous para procurarem pelo bem comum do povo a que chamam misteres e assistem na camara e vereações, e nas procissões reaes vão com suas varas vermelhas, acompanhando a camara e com as ditas varas assistem em um açougue que teem separado do dos nobres, e repartem a carne pelos do dito povo meudo e a quem lhes parece. Estes procuradores dos mesteres teem alguns privilegios que os Senhores Reis e Infantes passados lhes concederam os quais teem em um livro encadernado porque se governam, e entre outros muitos que teem é um que eles assistam com os juizes e vereadores na camara, quando nela se tratar algum negocio tocante ao bem comum ou quando escreverem cartas a Vossa Magestade e ainda nas eleições dos oficiaes, e porque acontece muitas vezes os juizes, vereadores e procurador do concelho fazerem vereações e mandarem cartas à corte, sem chamarem os ditos mesteres por os despresarem.
Deve Vossa Magestade mandar se lhe confirmem seus privilegios, conteudos nas certidões que ofereceu seu procurador, nas cortes passadas, e de novo fazer-lhes mercê conceder-lhes os privilegios e preminencias que teem os misteres da cidade de Lisboa, pois a ordem dada à cabeça é a que se deve guardar em todo o reino.
4º. É cousa muito certa e ordinaria lançarem o encargo de tesoureiro do concelho e de recebedor da siza geral que esta vila paga a Vossa Magestade aos homens do povo, e com ela se teem muitos homens perdido e ausentado dela, o que nasce de os poderosos lhe não pagarem e na camara se fazerem maiores gastos do que são as rendas do dito concelho, e de ordinario se escusam em cada um ano sete, oito e fazem muitos grandes gastos e dispendios de dinheiro e porque os ricos em que o dinheiro de Vossa Magestade está bem seguro são privilegiados e por respeitos se escusam, e todo o trabalho fica carregando nos mais pobres de que já hoje há muito poucos que não tenham servido. Deve Vossa Magestade mandar se faça na dita vila um tesoureiro do concelho perpetuo c outro sacador, pessoas em que estee o dinheiro de Vossa Magestade seguro, que não faltam homens bem abonados que o querem ser, dando-lhe porção conveniente por seu trabalho, o que a dita vila quer repartir pelos moradores dela, o que todos festejarão, e fará Vossa Magestade nisto muito grande serviço a Deus e ao dito povo muita mercê. E ainda que sem a concessão destas mercês que pedem são os suplicantes leais e fieis vassalos e ham de fazer em serviço de Vossa Real Magestade tudo o que lhe for ordenado, contudo com estas mercês ficam com maiores empenhos e de um modo ou de outro oferecem suas vidas, fazendas e pessoas, e em certeza de tudo, como procurador do povo meudo, em nome de todos assinam este memorial de que esperam de Vossa Magestade bom despacho, que com o seu senhor e rei natural lhes ha-de fazer mercês. Antonio Pinheiro. Francisco de Oliveira Ribeiro.


Panorâmica da Covilhã e Serra 
Resolução sobre os capitulos da mesma Vila, e dos mesteres dela.
Sua Magestade que Deus guarde, mandando ver os capitulos particulares, que lhe ofereceram os procuradores das Cortes da vila da Covilhã, foi servido responder-lhe.
Ao lº. Que por lhe fazer mercê havia por bem que a feira que lhe concedeu por uma provisão sua que se entenda concedida nas segundas-feiras de cada semana e que desta declaração se ponha postila na provisão, sem embargo de se lhe não diferir a este requerimento, no capitulo nove das cortes do ano de seiscentos e quarenta e um.
Ao 2º. Que havendo-se de lançar algumas fintas por provisões de Sua Magestade, na cidade da Guarda, poderá a camara da Covilhã mandar um ou dous procuradores que advirtam e requeiram tudo o que convier àquele povo e que para neste caso lhe mandar aviso a camara ela cidade da Guarda se lhe fará carta.
Ao 3º. Que ao que se lhe representa naquele capitulo e na carta da camara e outros quatro dos mesteres tem Sua Magestade concedido, na resposta da terceira parte de cortes do ano de seiscentos e quarenta e um e sobre o recebe­dor ser salariado e sobre a quantidade com que o deve ser, se remeta este capitulo pedir ao Conselho da Fazenda aonde os procuradores de cortes poderão pedir a resposta.
Ao 4º e 5º. Que as leis do Reino teem provido com toda a distinção no caso de que trata e que não convem alterá-las, principalmente intervindo prejuizo de terceiro.
Ao 6º. Que logo Sua Magestade manda passar ordem para que o alcaide mór vá assistir naquela vila e cumprir mui inteiramente com sua obrigação.
Ao 7º. Que nos capitulos particulares das cortes do ano de quarenta e um ofereceu  mandou responder que, com informação do procurador da comarca e copia do contrato, ouvindo as aldeias interessadas, se diferiria pelo Dezembargo do Paço aonde se deferirá com informação do corregedor da comarca, que há noticia tem de novo dado sentença neste caso.
Ao 8º. e ultimo. Que a materia daquele artigo toca ao capitulo geral de cortes e que Sua Magestade, ou se lhe proponha por aquela via ou não, está com muito particular advertencia de que a gente da ordenança não seja. obrigada a ir às fronteiras, se não em um caso de notorio aperto e necessidade de grande e os que actualmente forem vereadores há Sua Magestade desde logo por escusos e nesta forma se escreve ao governador das armas.

E quanto aos capitulos dos mesteres do povo que se oferecerão em papel à parte:
Ao 1º e 2º. Que este mesmo capitulo se ofereceo nas cortes do ano de seiscentos e quarenta e um a que se respondeu no setimo dos procuradores de vila, e não devia fazer-se di1igencia por parte dos mesteres, agora se lhe responde que este capitulo se remete ao Dezembargo do Paço com ordem que, oferecendo os mesteres o alvará de que fazem menção, sobre as penas das coimas, se lhe confirme por aquele tribunal, excepto a faculdade de matar bois e gado, achado em dano, por ser contra direito e ocasionado a odios e vinganças, que Sua Magestade deve atalhar; e as penas que pedem contra daninhos e outras ainda mais rigorosas, estão impostas pela Ordenação e pelas duas leis que depois se mandaram passar; e sobre as coimas dos poderosos e da governaça se tem passado alvará no ano de quinhentos setenta e um para que o provedor seja juiz, julgando conforme as posturas, e de novo manda Sua Magestade que o escrivão da camara e almotaceria escreva as ditas coimas em livro separado que o provedor per si julgará e executará antes que saia da vila como se executam as dividas de Sua Magestade, e o corregedor proverá tambem por correição conforme a provisão que há em que se manda que o não fazendo assim se lhe dê em culpa na residencia, e com a copia desta resposta que se remete por decreto ao Dezembargo do Paço pedirão ali os mesteres o despacho necessario.
Ao 3º. Que nem com estes capitulos nem com os das cortes de seiscentos e quarenta e um e as outras de seiscentos e quarenta e dois, se ofereceu este alvará de privilegios dos mesteres, oferecendo-se por sua parte o mandará Sua Magestade confirmar.
Ao 4º. Que não convem pelo prejuizo do exemplo conceder salario ao tesoureiro do concelho, pois o não há nos outros lugares do Reino e que na resposta que se deu nas cortes passadas se escusou este mesmo requerimento nas cartas que a vila escreveu.
Por esta resposta e outras semelhantes será presente a Vossa Magestade quam conveniente é que nos capitulos que de novo se oferecerem se declare se foram ou não oferecidos em outras cortes e a resposta que se lhe deu, e se declare  tambem se o que requerem é contra alguma lei geral ou particular, porque cada capitulo destes há mister um dia para se lhe dar resposta, por ser forçado resolver e conferir todas as cortes passadas e ainda os registos de leis extravagantes, provisões e ordens que vão às comar­cas. E Sua Magestade servido que vossa senhoria o diga assim aos procuradores das cortes e esta é uma das razões porque não podem sair suas respostas com a brevidade com que Sua Magestade deseja. Nosso Senhor etc. Do Paço quinze de Fevereiro de mil seiscentos e quarenta e seis. Pedro Vieira da Silva. Senhor dom Francisco de Faro.

Fonte – Cortes de 1646 - Chancelaria de D. João IV 17-233 v., Livro de Cortes 281 
As fotografias são de Miguel Nuno Peixoto de Carvalho Dias.


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