quarta-feira, 29 de janeiro de 2014

Covilhã - Os Tombos XV

    Vamos continuar a publicar tombos de várias instituições da Covilhã e seu termo. Já publicámos o Tombo do bens do Concelho (1615), os tombos dos bens da Misericórdia, dos de Santa Maria da Estrela, dos bens do Bem-Aventurado Senhor São Lázaro, dos bens e propriedades da comenda da Igreja de Santa Maria da Covilhã, de Sam Joam das Refegas existentes no espólio de Luiz Fernando Carvalho Dias, bem como as Inquirições de D. Dinis e de D. João I.
Verificámos agora que o Tombo dos bens e propriedades da Comenda da Igreja de Santa Maria da Covilhã -Titollo do tonbo mediçã / De demarcação de todos os beñs / E propriedades q pertencem / E sã comenda da Igreja de Stª / Mª matris desta villa de / Covilhaã” -  que começou em 9 de Abril de 1608, publicado neste blogue em 11 de Fevereiro de 2013, não estava completo, pois encontrámos a sua continuação numa outra pasta de Luiz Fernando Carvalho Dias.

Muralha na Porta do Sol (freguesia de Santa Maria)
Fotografia de Miguel Nuno Peixoto de Carvalho Dias
    
 […] + Uma quinta que se chama a dos lopez que está dálem da Rib.ra de Corges, limite desta Vª. que tem casas colmadas e muitos carvalho e terras de pão; está demarcada ao Sul com domingas alvarez viuva e com miguel antunes m.ºres no teixoso e com terras de luiz de campos e com terras de baltezar paez castelbranquo e tem pela dita banda 528 varas e pelo Nast. parte com o dito baltezar paez e com sistre lopez do Teixoso em 205 varas; Norte com lianor Lopez do Teixoso e com belchior vaz em 478 varas, e pelo poente com quinta de miguel da Silva de Serpa que é prazo do Cabido da Guarda e tem 220 varas e chama-se a quinta do carvalhal alto; leva de semeadura 180 alqueires de centeio. Emprazada a miguel da silva entrando no prazo acima.
+ uma terra que está a S. Sebastião, limite da Vª. por cima da hermida e pelo nascente parte com terras do concelho e com terras de S. Sebastião até entroncar na estrada do concelho em 176 varas; Norte até chegar ao Ribeiro de Santa detença (sic) e parte com terras de D. Inês e com souto e terras de manoel  mendes e tem 175 varas; Poente pelo ribeiro acima até dar e entroncar com terras de maninho em 240 varas; Sul até dar nas terras do concelho e parte com miguel da silva de serpa em 204 varas.
Leva de semeadura antes per romper 70 alqueires de centeio. Entra no prazo de miguel da silva de serpa com as mais propriedades atras; este miguel é filho e herdeiro de Diogo da Silva de Serpa; este prazo constitui um com o outro mas juntaram-se só num herdeiro na pessoa de seu pai e são por trez vidas.
+ Umas casas assobradadas que estam à entrada da carreira de traz da igreja de S. Maria que partem do Norte com casas que traz o licenciado alvaro Roiz; Nas.te com a rua publica do concelho; poente com quintal da Comenda as quais casas traz o licenciado Francisco Dias e sua mulher Dona Maria de Souza.
achou ele juiz do Tombo assy pelo tombo velho antigo como por test.ªs antigas e dinas de fee convem a saber por andre Roiz, por bertolameo Roiz, e Joam Fernandez Carapito, bertolameo alvrez e antonio lopez o velho e manoel vaz alfaiate e manoel martins moradores todos no lugar do fundão e levada e disseram ter a dita comenda muitas vinhas, olivais e azenhas e terras rotas e por romper   nas ribeiras dárverca e alverquinha e fernandinho lemite do fundão e levada onde chamam S. Miguel o anjo e está uma ermida que parece antigua devia ser quinta possuida por uma só pessoa que pelo tempo se devia devidir por diversas achando asi o juiz ser a dita propriedade que demarcou:
O dito limite começava por cima da dita hermida de S. Miguel e bem defronte da dita hermida seis varas dela direito ao caminho na borda do dito caminho publico do concelho que vai da levada para Covilhã e daí correndo pela dita estrada adiante indo para a vila até chegar onde se aparta a estrada da vila com a do ribeiro do leixado e entesta na terra de antº. de almeida que é de S. Martinho e daqui vai correndo pª. poente pelo norte e parte com terras de S. Martinho que traz antonio dálmeida. etc.
(há muitos anos se não fazia tombo desta comenda)

Segue a demarcação e aforamento de cada um dos aforamentos incluidos no prazo de S. Miguel o Anjo.
Antonio luiz, escrivam do fundão
Cascalhais entre a alverca e a alverquinha

Indicação dos predios

+ Um chão junto ao olival passando a Ribeira pª. a estrada que pª a levada;
+ Uma vinha aos cascalhais d’alverca entre a ribª. dalverca e a alverquinha.
+ outra vinha aos cascalhais por cima da anterior.
+ outra vinha aos cascalhais contigua às anteriores.
+ um chão de regadia à fonte do fernandinho.
+ uma vinha e uma terra calva a S. Miguel o Anjo, limite da levada.
+ uma vinha grande em alverca, limite do fundão.
+ Um chão pequeno pegado à dita vinha.
+ Uma azenha e um lagar d’azeite.
+ nas costas da dita azenha um pomar com suas maceiras, e cerdeiras, frente às portas do lagar.
+ Por cima da dita azenha um chão tapado de parede e comaros altos entre a serventia e a dita azenha.
+ Um chão de regadia tapado, entre o Rib.º do fernandinho e serventia da dª. azenha.
+Uma terra calva com um pequeno de vinha defronte da dita azenha.
+ Um cercado tapado, com vinha e terra calva a S. Miguel o Anjo.
+ Uma terra calva pegada ao dito cerrado.
+ Uma vinha no fundo do ribeiro do caranguejo limite do fundão.
+ Uma vinha no fundo d’alverquinha.
+ idem no mesmo local.
+ idem entre a alverquinha e a serventia do caranguejo.
+ idem a S. Miguel o Anjo.
+ idem
+ Um chão tapado de parede e cancela na serventia d’azenha.
+ Um chão tapado de olival antre a alverquinha e a serventia que vem pelo ribeiro do caranguejo.
+ Fora da demarcação e tombo outro chão de regadia com seu olival dentro, antre alverca e alverquinha.
+ Fora da demarcação um cham d’olival no mesmo sitio, por cima da estrada que vai do fundão pª. Valverde.
+ Dentro da demarcação um chão de regadia tapado, com olival e pomar dentro, com uma cazinha, por baixo da fonte de fernandinho.
+ Fora do tombo, um chão e olival por cima da estrada da fonte do fernandinho.
+ Fora do tombo, ao cabeço do seixo, uma terra calva da dita cabeça ao Ribº. das taliscas.
+ Fora do tombo uma terra calva por baixo da fonte de raio e da estrada que ora vai para Covilhã do fundão.
+ Fora do tombo, por baixo de S. Marcos, do Fundão, e estrada que vai do fundão pª. alcaria uma terra centeeira com sua oliveira.
+ idem, um chão de regadio com seu olival em alverca.
+ Titulo das propriedades que a dita Comenda tem no lugar do Souto da Casa, termo da Covilhã.
+ Uma courela de terras com 5 cerdeiras e 2 oliveiras às varzeas, limite do Souto da Casa, que atravessa a ribeira da Gardunha, por cima da estrada que vai de S. Vicente da Beira pª. o freixial.
+ Outra courela de terra à varzea do dito lugar pela banda de cima da dª. terra.
+ Outra terra calva na varzea do Souto da Casa, por cima das ditas terras.
+ Outra courela de terra que foi vinha à varzea do dº. lugar, com um alemo (sic) formoso.

Nota dos editores – O investigador deixou a seguinte nota: “Fiquei na página 43”, o que nos leva a pensar que a cópia do tombo está incompleta.

Fonte – ANTT, vol.  , pag.15 vº a pag.43
O autor deixou-nos estes dados: P. N.es nº 213 Nº de ordem 187 - 188 2 vols (1608) Fot. (1722) 242 pgs

As publicações do blogue:

Os tombos já publicados neste blogue:
http://covilhasubsidiosparasuahistoria.blogspot.pt/2014/01/covilha-os-tombos-xiv.html
http://covilhasubsidiosparasuahistoria.blogspot.pt/2013/11/covilha-os-tombos-xiii_24.html

domingo, 26 de janeiro de 2014

Covilhã - Memoralistas ou Monografistas VI


Continuamos hoje a publicar os monografistas da Covilhã, começando com algumas reflexões de Luiz Fernando Carvalho Dias já publicadas neste blogue. Seguidamente vamos concluir a apresentação de a Memória de João Macedo Pereira Forjaz.

“Convém enumerar os autores de monografias da Covilhã, os cabouqueiros da história local, aqueles de quem mais ou menos recebi o encargo de continuá-la, render-lhes homenagem pelo que registaram para o futuro, dos altos e baixos da Covilhã, das suas origens, das horas de glória e das lágrimas, dos feitos heróicos e de generosidade e até das misérias dos seus filhos, de tudo aquilo que constitui hoje o escrínio histórico deste organismo vivo que é a cidade, constituído actualmente por todos nós, como ontem foi pelos nossos avós e amanhã será pelos nossos filhos.” […]
[…] O século XIX abre com o trabalho do luso-brasileiro, oriundo da Covilhã, Dr. João António de Carvalho Rodrigues da Silva sobre a indústria dos lanifícios. Tivemos oportunidade de publicar uma segunda edição deste curioso estudo na revista “Lanifícios”, (a) no ano de 1955. Continua a série com a memória do Dr. João de Macedo Pereira Forjaz, bastante documentada.” (b)

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“Esta Memória da Covilhã e da sua indústria, da auto­ria de João Macedo Pereira Forjaz foi escrita para a Aca­demia Real das Ciências de Lisboa. Como instrue a notícia manuscrita que a antecede, subscrita pelo Dr. António Mendes Alçada de Morais, que no-la transmitiu, não está completa, embora o pareça, e o seu autor teria sido advogado, segundo a mesma fonte.
Cumpre esclarecer que não encontrámos, no fundo da Biblioteca da Academia das Ciências rasto desta Me­mória, pois não deve ter chegado a entrar na referida instituição; do autor também não achámos qualquer refe­rência no arquivo da Universidade de Coimbra; assim haverá, que rever a hipótese da profissão que lhe foi atri­buída. (1)
Devemos a gentileza desta cópia ao Dr. Luiz Filipe da Fonseca Morais Alçada.
     O Dr. António Alçada, como era mais conhecido, nota­bilizou-se como advogado e jurista: escrevia elegantemente e deixou inéditos um livro de versos e um romance incom­pleto cujo enredo decorre na Roma dos Césares. Publicou além de várias minutas de recurso para os tribunais superiores, uma pequena Memória da Covilhã, sua terra natal, como representação da cidade, nos pri­meiros anos da república, destinada a conseguir uma pro­moção a capital de distrito.
Como seu tio, Dr. Valério Nunes de Morais, também o Dr. António Alçada foi jornalista de mérito.
No capítulo da sua actividade jornalística cabe referir não só alguns estudos de história da cidade, publicados na peugada do seu referido tio ou em colaboração com ele, mas também outros, que, sob o pseudónimo de Diogo Nu­nes, dedicou à divulgação dos progressos industriais, ins­pirado em revistas técnicas estrangeiras, o que representa uma contribuição meritória à formação técnica da cidade que lhe foi berço.” (c)

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“Este manuscrito é devido à pena do eminente advo­gado da vila da Covilhã, Dr. João de Macedo Pereira For­jaz, que o fez para concorrer como candidato à Academia Real das Ciências de Lisboa.
Não chegou a concluí-lo. Parece aliás, concluído.
Esta cópia foi textualmente extraída, sem nada alte­rar do manuscrito existente na biblioteca do Ex.o Se­nhor Dr. Manuel José Gonçalves dos Santos Gascão, con­servando-se a própria ortografia.
Esta cópia foi tirada em 1905 por António Mendes Alçada de Morais e pertence-lhe.” (d)

Descrição Analítica e Económica da Notável villa da Covilhã, do seu antigo, e grande distrito, e da famigerada Serra d'Estrela, acompanhada de notas e peças justificativa.
(Continuação)

Capítulo IX

Do Monte Hermínio, hoje Serra d’Estrela e suas notabilidades

     O Monte Herminio, bem conhecido nas historias antigas, primeira habitação dos Erminios, progenitores dos habitantes da Vila de Manteigas, é um dos mais elevados e celebres de toda a Espanha, não só pelas suas raridades, mas por ter sido o temor dos Romanos; ainda hoje se vê um vale, junto ao mais elevado do mesmo monte, donde estes povos estavam quando vieram dar batalha a Julio Cesar; em um campo que fica ao Norte da dita vila, o qual ainda conserva o nome de Campo Romam, corrupção do primeiro nome de Campo dos Romanos, onde se tem des­coberto varios sepulcros em marmore e outros monumentos que asseveram esta verdade.
     Hoje, porem, e há muitos seculos, se não conhece este monte, pelo sobredito nome de Hermínio mas sim da Serra de Estrela o qual se lhe deu, por sua eminencia ou por uma penha que tem aparencias duma estrela, ou doutra estrela que sobre ela se vê aparecer e se avista da parte do Norte.
     No mais alto da mesma serra se conserva tambem um rochedo com o nome de Mallhão de Estrela que fica ao Sul e dali se avista parte do mar oceano, as serras mais elevadas de Espanha; e o Marão, serra transmontana; por alguma destas singularidades se apelidou, sem duvida, Serra d’Estrela.

Panorâmica da Serra da Estrela

     Esta mesma Serra que tem de comprido vinte leguas, principiando na Cidade da Guarda, e finando nos confins de Goes, contem em si varias raridades.
     Logo no seu mais alto cume, junto quasi ao sobredito Malhão d' Estrela se acha uma fonte chamada de Manuel Pires cuja agua é um grau mais fria do que a neve: nesta fonte tem origem o Rio Zezere de que já falámos que corre ao longo do Sul até ao principio do grande vale que forma a mesma Serra, e deste entra a correr para o Nascente até à Vila de Belmonte, engrossando muito o dito Rio uma famosa fonte que está quasi ao cimo do mesmo vale a que chamam de Palos Martins, tendo igual frialdade da neve, e sendo tão copioso o seu nascente que logo ali podem andar duas rodas de moer.
     Neste lugar há abundancia de arvores silvestres: freixos framoazeiros, azeveiros, sabugueiros, azinhos e genipro, e outras, a que deram o nome de Pomar de Diogo Mazano (sic=massano?).
     Descendo legua e meia para o vale, se acha da parte do Poente, junto ao Zezere, um grande nascente de agua sulfurea, e salitrosa que tem tres graus de calor, a cujo solo chamam as Caldas, onde há 12 cazas para se acomodarem os enfermos que ali concorrem a procurar o remédio de suas queixas e uma capela para ouvirem missa; um quarto de legua abaixo para o mesmo Poente se acha situada a dita Vila de Manteigas. (30)
     Tornando agora à fonte de Manuel Pires, origem do Zezere, de que acabamos de falar, logo desta para o norte se encontra uma grande Rua que desce do mais alto da Serra até ao Cantaro delgado e desta pela parte do Sul até à sua raiz, a que dão o nome de Rua dos Mercadores.
     O cantaro delgado é um grande rochedo que tem a sua raiz em um vale, a que chamam Alvergaria, e Covão da Ametade, sobre encostado à Serra até ao cimo desta, e daí continua em forma piramidal, sobre si mesmo, e terá meia legua de altura, produz muita argenciana, difícil de colher, pela aspereza do rochedo.
     Correndo ao mesmo Norte se acha outro semelhante Rochedo a que chamam o Cantaro Gordo, deferindo do Delgado em não passar do cume da Serra e tem ao fundo uma lagoa que chamam do Cântaro.
     Segue-se a esta outra maior Alagoa a que chamam do Pachão, em cujo cimo, junto ao Covão do Ferro se gosa o mais claro e famoso eco que excede ao de Sant'Ana na Cidade de Coimbra e para cima se acham as tulhas da neve.
     Todas estas notabilidades estão no limite de Manteigas que termina no cume da serra; e bem assim os de Loriga, Seia, Gouveia, Covilhã, Folgosinho e Linhares.
     Na parte do limite de Seia, no mesmo cume, para o Poente, se acha outra Alagoa, a mais notavel pela sua grandeza, chamada a Escura a qual tendo-se aprofundado em 6 de Agosto de 1667, na presença de muitas pessoas, em todas as partes e no mais profundo, se achou ter de alto 110 palmos ou onze braças que é o mesmo.
     E seguindo para o Norte está outra Alagoa, chamada a Comprida, donde tem origem o Rio Alva.
     Na mesma serra há outro rochedo a que chamam as Penhas Douradas, onde terminam os termos ou limites de Seia e Gouveia e no limite desta Vila, em pouca distancia das ditas Penhas nasce o Rio Mondego que corre pela Serra ao Norte, até ao lugar da Faia, termo da Cidade da Guarda, onde principia a fertilisar aquele grande Vale.
     Perto do nacente deste grande Rio, seguindo o Norte, está o antigo Campo Romão, de que se falou ao principio, onde terminam os termos de Gouveia e Manteigas.
     Não se tem até agora, nesta serra, descuberto mineral algum, as suas terras são pela maior parte arenosas, as pedras de marmore rude mas é abundantissima de aguas cristalinas e fertil de frutos e plantas salutiferas, produzindo igualmente muitos pastos pois sustenta em si 60.000 cabeças do gado de lã, alem do caprino e vacum, que serão 30.000, dos povos que tem parte na dita serra, que são os mencionados.
    Até ao ano de 1777 conservaram os Religiosos de N. Senhora de Agua­dalupe o privilegio de pastarem na dita serra 16.000 cabeças de gado suas e 2.000 dos seus criados, que lhes foi derrogado no dito ano na Mesa das confirmações, do qual se passou alvará para as Camaras vizinhas que existe nos seus arquivos.
     No tempo do infante D. Luiz havia alcaide na dita serra, por carta sua registada na Camara da Covilhã em 1552, o qual também havia em Manteigas; eles se juntavam quatro vezes no ano, na dita serra, no Verão, quando vinham os gados para ela; e quando os pastores traziam nos seus rebanhos gados alheios, lhos levavam, e os nutriam em um curral, e fazendo audiencias, mandavam apregoar pelo andador da Serra, confirmado por Sua Alteza; que toda a pessoa que ali conheceu gado alheio o manifestasse, dando-lhe os Alcaides primeiro juramento.
Serra da Estrela - Senhora da Boa Estrela (Nossa Senhora dos Pastores)
A Senhora dos Pastores com neve
     Tambem ali determinavam as diferenças que havia entre os pastores, assim de gados como de soldadas e dividas, para o que tinham escrivão, que ia de Manteigas por distribuição, por ser o seu termo.
     Tambem em dia de S Tiago e de S. Mateus iam à Ponte Pedrinha, com escrivão de Covilhã, e determinavam o mesmo, e o gado que lhes não aparecia dono o julgavam ao vento, conforme o Foral da dita Vila.    Deste gado levava o Alcaide-mór o terço, o concelho outro terço, e os alcaides outro; de que estavam de posse havia mais de 300 anos, desde o Reinado do Senhor D. Sancho o 1º.
     Hoje já não há Alcaide na Covilhã e só se conserva o de Manteigas mas por se ter demolido a Capela de Santo Antonio da Argenteira na dita serra, no referido sítio, da Nave d'Argenteira. se pratica hoje junto da sobredita Vila, em outra capela do mesmo Santo, decidindo-se as mesmas questões, jogando a barra e levando o vencedor do tiro um grande bolo de trigo de um alqueire.

Notas
(30) A população desta Vila é de 500 vizinhos, unida a duas freguesias que são vigarias do Padroado Real. S. Maria uma e S. Pedro outra, pertencentes às Comendas da Ordem de Cristo, com sua Misericordia separada. Tem jurisdi­ção ordinaria, civel, criminal e orfãos, com capitão-mor de ordenanças; foi tri­butada com direitos reais em 1500 pelo Senhor D. Sancho o primeiro, que o senhor D. Diniz mudou para 60 maravidis de ouro, os quais o senhor D. Manuel, no ano de 1514, no foral que deu novamente àquela vila, mudou para a quantia de 5400, que se pagam ao senhorio dos ditos direitos que é a Casa de Belmonte, por doação regia. Gosa esta vila de varios privilegios, o 1º) de serem dados os maninhos aos seus moradores, repartindo-os a Camara para os lavrarem, sem pagarem tributos mais do que o dizimo a Deus, graça que lhe concederam os primeiros Reis de Portugal para haver quem habitasse aquela terra e se poder aumentar por ficar no meio da mencionada serra, confirmado pelo capitulo 3º do Foral e por Sentença do Juizo dos Feitos da Coroa de 19 de Novembro de 1520. 2.º) O poderem os seus moradores pastar com os seus gados livremente nos baldios da Covilhã e seu termo, confirmado em 1768, e em parte do termo de Gouveia, onde chamam o montado, que é da Coroa, por compromisso de 1420, celebrado na Igreja de S. Pedro da Vila de Gouveia, e confirmado pelos Duques de Vizeu, em tempo que tiveram o senhorio daquela Vila, até ao tempo do in­feliz D. Diogo, donde passou para a Coroa, e depois pelo Senhor D. João 3º ao qual cedeu a Camara daquela Vila o Padroado daquelas Igrejas pela nomeação do Juiz Vedor dos Panos de Lã, que hoje não possui, o que consta do alvara regio de 14 de Dezembro de 1524 que está e o mais de que se faz menção no Cartório da Camara da dita Vila.

Notas dos editores - a) Revista que era propriedade da FNIL - Federação Nacional dos Industriais de Lanifícios.
b) Publicação neste blogue em 29 de Maio de 2011.
c)Texto da autoria de Luiz Fernando Carvalho Dias.
d)Texto de António Mendes Alçada de Morais.
1) Encontrámos posteriormente no espólio de Carvalho Dias as seguintes referências a cargos desempenhados por João de Macedo Pereira da Guerra Forjaz de Gusmão, que denotam não haver sido formado em Direito:
Vedor dos Panos da Fábrica da Covilhã - alvará de 23/10/1804, Livº 73, fls. 148 da Chancelaria de D. Maria I;
Escrivão do Geral da Vila da Covilhã, alvará de 07/01/1806, Lº 76, fls. 143, da Chancelaria de D. Maria I;
Repartidor dos Órfãos da Vila da Covilhã, alvará de mercê 07/01/1806, Lº 74, fls. 259 vº e alvará de propriedade do mesmo, da mesma data, Lº 76, fls. 143 da mesma Chancelaria, cargo que renunciou em 23/10/1813, Lº 16, fls. 122  da Chancelaria de D. João VI.

Notas dos editores - A Nossa Senhora da Boa Estrela situa-se no Covão do Boi a 1850 m de altitude, foi esculpida em baixo-relevo pelo escultor António Duarte e inaugurada em 1946.
- Duas fotografias são do espólio de Luiz Fernando Carvalho Dias.

As publicações do blogue:
http://covilhasubsidiosparasuahistoria.blogspot.pt/2012/09/covilha-as-publicacoes.html
http://covilhasubsidiosparasuahistoria.blogspot.pt/2013/05/covilha-o-2-aniversario-do-nosso-blogue.html

quarta-feira, 22 de janeiro de 2014

Covilhã - Inquéritos à Indústria dos Lanifícios XXV-XXIII

Inquérito Social XXIII

Continuamos a publicar um inquérito social “Aspectos Sociais da População Fabril da Indústria dos Panos e Subsídios para uma Monografia da mesma Indústria” da autoria de Luiz Fernando Carvalho Dias, realizado em 1937-38.

Assistência Médica e Social

            A assistência social é prestada aos operários através do Instituto Nacional do Trabalho e do organismo católico da JOC. O Instituto Nacional do Trabalho, pelas informações colhidas entre os operários de Lisboa, a quando do Inquérito, não é conhecido. Na Covilhã a sua acção é notável; em Gouveia, ao tempo do inquérito, também pouca influência exercera e o mesmo se pode dizer de Castanheira de Pera. Os operários do Norte mostraram conhecer-lhe bem os benefícios.
            Com assistência não queremos referir-nos à assistência dos médicos das Companhias de Seguros, provocada pelos acidentes de trabalho, mas à assistência médica vulgar, sempre que haja doença do operário. Esta assistência médica é prestada por Associações de Socorros Mútuos, de que os operários são associados e, excepcionalmente pelas fábricas, que tem médico próprio para os seus operários.
            Assim, segundo os nossos boletins de inquérito, na Covilhã há 1630 operários que têm assistência médica; esta é prestada pela associação de Socorros Mútuos Covilhanense e pelas Casas do Povo de Aldeia de Carvalho e pela Associação Católica Feminina Operária.
           No Tortosendo há operários, sócios de Caixas de Previdência, estas sem aprovação oficial, constituída por pequenos grupos de amigos e por alguns sócios da Associação de Socorros Mútuos Covilhanense.
            Em Cebolais apenas 5 operários têm assistência médica, mas são naturais da Covilhã.
          No Teixoso há 138 operários de lanifícios inscritos na Casa do Povo, com assistência médica e outros benefícios, mediante uma cota de $50 mensais.
          Nesta região da Covilhã, operários há que são sócios da Associação Mutualista Covilhanense e das Casas do Povo de Aldeia de Carvalho e do Teixoso, conjuntamente.
            Tanto a Associação de Socorros Mútuos Covilhanense, cujos estatutos juntamos, como a Associação Católica Feminina, além da assistência médica prestam outros serviços materiais valiosos aos seus associados.
            Em Unhais da Serra, na “Penteadora”, está estabelecida uma Caixa de Previdência para a qual os operários concorrem com 8% dos seus salários. Porém, segundo os nossos boletins de inquérito, à data em que eles foram preenchidos, os operários da referida fábrica não tinham assistência médica.
           No grémio de Gouveia: temos 196 operários com assistência médica. Destes 81 são sócios da Casa do Povo de Manteigas que pagam a cota mensal de 1$00; 5 de uma Casa do Povo, perto de Viseu; 5 de Seia; 1 na Guarda; 4 em Sampaio e 100 de Gouveia.
            No grémio do Sul há 3 fábricas onde nos declararam que havia médico à disposição dos operários. Em Arrentela há uma Caixa de Socorros, dentro da fábrica, para a qual os operários concorrem com 1$00 semanais. Em Santa Clara, de Coimbra, os operários costumam dar a guardar o seu dinheiro aos usurários do lugar, que o manobram por sua conta, em troca de serviços clínicos.
            Em Lisboa há cerca de 500 operários, sócios de Associação de Previdência, e outros havia que no fim de 10 ou 15 anos de sócios, se riscaram delas, por falta de cumprimento de algumas disposições a que estas se encontravam obrigadas; outros riscaram-se por razões de economia particular; outros porque as associações fecharam as portas.
            Em Mação e em Minde a previdência é desconhecida.
            Em Coimbra há 30 operários sócios de Associações de Socorros; em Portalegre 22; em Arrentela 291 (na fábrica); em Alenquer 2; em Alhandra 58; e em Vila Franca de Xira 22. Ao todo, no grémio do Sul, 925 operários são sócios de Associações de Socorros. Vários há que têm 2 associações de Socorros. Há em Lisboa, também 108 operários sócios de Funerárias.
            Em Castanheira de Pera é reduzidíssima a assistência. Apenas 2 empregados naturais da Covilhã têm o seu montepio e 3 operários são membros de uma Casa do Povo.
            No grémio do Norte: dentro da cidade do Porto 74 operários são associados de Associações de Previdência e 87 nas outras terras do mesmo grémio. Além disso, no Porto há 157 operários sócios de funerárias. As funerárias recrutam, portanto, os seus sócios entre os operários de Lisboa e do Porto. A Previdência está mais organizada nos grandes centros industriais; nos pequenos centros não temos reflexos dela senão, e muito reduzidamente, através das Casas do Povo.

Desemprego

            Ao desemprego, na indústria de lanifícios, já foi feita referência neste relatório. Quando se realizou este inquérito, é preciso não esquecer, que foi na época do ano em que rareava mais o trabalho (portanto podemos dizer que o desemprego no ano anterior ao Inquérito a que fazemos referência, diz respeito a um pessoal que podemos considerar permanente) trabalhavam nas fábricas os seguintes operários que durante esse ano estiveram algum tempo sem trabalho:

Grémio da Covilhã, 389 assim distribuídos:

Covilhã –  198
Cebolais – 191

            O trabalho em Cebolais caracteriza-se pela sua inconstância: há pessoal a trabalhar a jornal, na indústria, que são ao mesmo tempo serviçais do patrão, de sol a sol. Nas estatísticas deste inquérito, como já referimos algures, não figuram os tecelões manuais das aldeias da Covilhã, excepto os do Teixoso. Se aparecessem nestas estatísticas, maior seria o número de desempregados no grémio da Covilhã, apesar de no Teixoso ter sido quase nulo o desemprego.

Grémio de Gouveia, 258 assim distribuídos:

Mortágua
61
Gouveia
26
Melo e Seia
23
Moimenta
12
Guarda
2
São Paio
26
Trinta e Maçainhas
95
Manteigas
13

Grémio do Sul, 478 assim distribuídos:

Lisboa
278
Arrentela
10
Portalegre
39
Alenquer, Alhandra e
Vila Franca


151

As fábricas de Lisboa e de Alenquer não trabalhavam os 6 dias da semana; Portalegre estava a 3 e a 4 dias, o mesmo sucedendo ao pessoal de Arrentela nalgumas secções.           
           
Grémio de Castanheira de Pera, 34 assim distribuídos:

Castanheira de Pera – 31
Avelar -                        3

Grémio do Norte, 186, assim distribuídos:

Porto –       138
Província -   48

            As conclusões que estes números sugerem, são feitas no Capítulo que consagramos à grande e à pequena empresa. Para lá remetemos o leitor.
            O desemprego, ainda durante o inquérito social, foi atacado pela FNIL, com o fim de auxiliar aqueles operários que a organizaçaõ industrial ia desempregando. Por isso estabeleceu-se um subsídio semanal a cada um desses operários, subsídios esses pagos pelos industriais; não impediu porém este subsídio que o desemprego aumentasse a olhos vistos, apesar de  todos os esforços em limitá-lo àqueles operários que a organização dos quadros permanentes de tecelagem e o receio do industrial pelas medidas sociais anunciadas, atirava para ele. Já dissemos algures que os industriais continuaram a admitir aprendizes, em substituição de todos aqueles operários que atingiam 18 anos e, com esta idade um aumento de salário. Diziam eles que pagavam para o desemprego, que havia um subsídio estabelecido para os desempregados, e tinham, por isso, direito a proceder assim. Daqui provinha que o desemprego era, não já um fruto das medidas adoptadas para estabilizar a profissão do operário e dar à indústria operários capazes, através de uma maior sequência no trabalho dos lanifícios, mas da sofreguidão do patronato.
            Do reflexo social que tiveram os subsídios aos desempregados no meio operário, já não me compete tratar, porque se refere a um momento posterior ao preenchimento dos boletins.

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            Contra o desemprego, constituem subsídio algumas associações de previdência e socorros mútuos de que são sócios muitos operários enumerados na secção de assistência.

Prisões

            As prisões registadas nos boletins do inquérito são geralmente provocadas por ofensas corporais, uma ou outra por crimes contra a honestidade; algumas por crime de furto, apresentando neste pormenor a região de Seia um predomínio sobre todas as outras; crimes políticos e suspeitas deles também aparecem sobretudo em Lisboa, Alhandra e Covilhã. No grémio do Sul apareceu um único caso de prisão por crime de homicídio voluntário.

Vestuário

            Já referimos a tendência para o luxo existente nas mulheres e nas raparigas e a influência que este exerce na desmoralização. Já observámos também a facilidade de pagamento nas fazendas para o seu vestuário e de suas famílias, que operários obtêm nas fábricas. Não há mais que relembrar isto.

Alimentação

            A alimentação do operário de lanifícios - referimo-nos especialmente à Covilhã -  é uma alimentação abundante e boa, porque gastam na mesma semana aquilo que ganharam. A alimentação tem para eles mais valor que o vestuário, ao contrário do que acontece noutras regiões e noutras indústrias.
            Aqueles que vivem longe da fábrica comem o seu almoço na mesma no local de trabalho, os que vivem perto da oficina vão almoçar a casa.

Descanso Semanal

            O descanso semanal é ao Domingo; às vezes, por razões especiais, há algumas profissões cujos operários gozam noutro dia da semana. Sirvam de exemplo os operários dos estendedores de lã que têm, por vezes, de aproveitar o sol de um domingo e os mecânicos que têm de reparar as máquinas.

Feriados

            Aqui referimo-nos exclusivamente à Covilhã. Além dos domingos, costumam guardar os dias santos; os feriados oficiais são, em regra, desprezados. Não se trabalha no dia 1 de Janeiro, 6 de Janeiro, 19 de Março, segunda feira de Páscoa, segunda feira de Pascoela (Santo Antão), 1º de Maio, quinta feira da Ascensão, Corpo de Deus, S. Pedro, S. Tiago, 15 de Agosto (romaria da Senhora do Carmo), 1 de Novembro, 8 de Dezembro e 25 de Dezembro. O dia 1º de Dezembro começou a ser feriado obrigatório das fábricas em 1937. Os dias feriados, quando o tempo o permite, são aproveitados pelos operários da Covilhã em passeios pelo campo ou pela serra. O dia 15 de Agosto repartem-no pela romaria da Srª. do Carmo, no Teixoso, e pelo rio Zêzere, onde vão tomar banho.

Regime de trabalho

            O regime de trabalho é de 8 horas diárias. Antes do estabelecimento das 8 horas, trabalhava-se a semana inteira, os operários dormiam na fábrica e o descanso era o mais reduzido possível. Os pais levavam as crianças pequenas para a fábrica, para lhes encherem as canelas de fio.

Serões

            Os serões acabaram; só são permitidos por lei nos termos estabelecidos. Nos centros mais recuados da província, onde a fiscalização é mínima e os operários menos conscientes dos seus direitos, ainda há muitos abusos.
            Abusos nos horários de trabalho encontrámo-los em Arrentela, Mação, Minde, Cebolais de Cima, Maçainhas e Trinta, em várias aldeias do grémio de Gouveia, em certas fábricas do grémio do Norte e sobretudo no grémio de Castanheira de Pera, onde Chimpeles ocupa o primeiro lugar no desconcerto.

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