Abordamos hoje um
assunto que atravessa os séculos, abarca variados produtos e pessoas e mantém o
poder em constante alerta: é o comércio ilegal. Na opinião de Luiz Fernando Carvalho Dias o
contrabando de panos é um dos factores que contribuiu para a concorrência,
muitas vezes desregrada.(1) Luis Miguel Duarte, no seu “O Comércio Proibido”,
afirma que “sem esquecer outras mercadorias, as grandes correntes de comércio
ilegal parecem-me ser a passagem de gado para Castela e o contrabando de panos
de Castela para Portugal.” Os três documentos que apresentamos – desta época e
sobre o assunto foram os que encontrámos no espólio de Luiz Fernando Carvalho
Dias – são representativos, porque nos permitem extrair várias conclusões sobre
o comércio proibido nesta zona:
- Os judeus estão metidos neste negócio.
- Nos segundo e terceiro documentos que
apresentamos: um físico, morador na Guarda, trocara ouro e prata por panos;
outro trouxera panos sem terem o selo da alfândega. É que ao longo da fronteira
terrestre a Coroa criou alfândegas ou portos secos; aqui os comerciantes deviam
pagar a dízima ou sisa e, concretamente no respeitante aos panos, a mercadoria
era selada.
- A pena, para os infractores, era pesada, pois
perdiam as peças contrabandeadas e até todos os bens móveis e de raiz a favor
da Coroa, que podia oferecê-los a quem quisesse. Nos referidos documentos os
bens apreendidos são dados aos escrivães da Câmara, Rui de Pina e Fernão de
Pina.
- As Cortes e as Cartas régias vão tomando
medidas sobre este assunto, mas a erradicação do problema não foi conseguida.
Temos como exemplo um documento de D. Afonso V – um “Alvara de detreminaçom” -
com decisões tomadas em Cortes na cidade da Guarda. Também nesta altura os
representantes fronteiriços do poder militar(os fronteiros), por vezes, tinham
na mão (a seu favor) o comércio ilegal.
Iremos
publicar mais tarde documentos do reinado de Dona Maria II sobre o contrabando
de lanifícios na Covilhã.
Alvará
de El-Rey D. Affonso 5º em que se comtem varias ordenaçoens que o mesmo Senhor
concluio nas Cortes que fes na Cidade da Guarda
Nos El Rey fazemos saber a quantos este nosso
Alvara de detreminaçom virem que consirando Nos como principal cargo de
todo boo Rey, e virtuozo principe he dever sempre dezejar e procurar aquellas
couzas que forem serviço de Deos honre, e acrecentamento de seu Estado bem e
proveito de seus Regnos, e Senhorios querendo Nos a ello segumdo devemos com a
graça de Deos satisfazer ao qual por sua infinda clemencia aprouve semelhante
cargo nos dar em as Cortes geraaees que ora celebramos em a nossa Cidade da
Guarda detreminamos com acordo de nosso Conselho, e das ditas Cortes alguuas
couzas, que semtimos por serviço de Deos e nosso, bem, e acrecemtamento de
nossos Regnos as quaaees se ao deamte seguem.
Primeiramente acerqua dos gramdes dapnos que se recreciam a
Nós, e a nosso Pouoo por os Portos serem muitos em nossos Regnos, e se tirar
ouro, e prata comtra nossa defeza, por trazerem panos de Framdes, e outras
couzas pellos ditos Portos per que os Mercadores leixavão de carregar suas
mercadorias per mar, e trazerem seus retornos honde se milhor recadavão
nossos Dereitos e era aazo de as vinhas olivaes, e Herdades seerem bem
aproveitadas, e se seguirem outros semelhantes proveitos.
Determinamos, que per os ditos Portos de Castella não
tragão outros pannos de láa salvo pardos, e branquetas deste janeiro em diamte
que ora vem da Era de mil, e quatrocentos sassenta, e seis e os que outros
pannos trouxerem lhe sejam tomados para Nos, e nos ditos Portos se ponhão boas,
e discretas pessoas para com boa diligencia se fazerem os alealdamentos
e o que for serviço nosso e prol de nossos Regnos. (2)
Neste largo, para onde dá a Judiaria e a Igreja de S. Vicente,
se realizava um importante mercado
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Pormenor da fachada da Igreja de S. Vicente |
Dom Joham ec. A quantos esta nossa carta
virem ffazemos saber que nos diserom ora que gomez aº m.ºr na guarda, metera
dos Regnos de castella em estes nossos tres Retalhos de pano sem serem
assellados em nossos portos per nossos officiaes pella quoall rrezam sse assy
he como nos dizem per bem de nossas ordenações em tall caso feitas elle
perde pª nos os ditos Retalhos e majs todos seus bens moues e de raiz E nos
os podemos com dyreito dar a quem nossa merce ffor E ora queremdo nos ffazer
graça e mer//cê a fernam de pina espreuam de nossa camara / Teemos por bem e
ffazemos lhe delles merce quamto a nos com direito pertencer e com direito os
dar podemos e porem mandamos a todos quantos juizes e justiças oficiaes e
pessoas a que esto pertencer e esta nossa carta for mostrada que estando
perante eles citado e ouvjdo o dito gomez aº etc. dada em santarem a b djas
de mº el rrey o mandou per dom martinho e vedor da sua fazenda vicente carneiro
a fez de mjl e iiij lxxxbij. (4)
- As fotografias são da autoria de Miguel Nuno Peixoto de Carvalho Dias.
Fonte – 2) Biblioteca da Academia das Ciências, Cod. 412, fls
3) e 4) ANTT - D. João
II, livº 4, fls 85
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