Vamos iniciar hoje a publicação
do tema - As Sisas - pois encontrámos alguns documentos sobre o assunto no
espólio de Luiz Fernando Carvalho Dias.
As
sisas são um imposto indirecto que incidia sobre contratos de compra e venda ou
troca. Era um imposto municipal temporário e existia pelo menos desde o século
XIV, mas, por exemplo, D. Fernando aproveitou-se várias vezes dele, tornando-o
um tributo régio o que levava o povo a apresentar em Cortes queixas contra o
Rei.
Fernão
Lopes, na “Crónica de D. João I” diz-nos: “ E vemdo os Reis taees remdas de
sissas, avemdo vomtade de as aver mostravã ao povo necesidades pasadas ou que
eram por vir e pedimdolhas graciosamête por dous ou tres annos que loguo as
leixariam e outorgando as desta guisa em adiã depois outras necesidades pera
que as aviam mester e pediam nas por mais tempo; e asy lhe ficou a pose dellas,
mas nã que elles as deitase”
É
D. João I que nas Cortes de Coimbra de 1387 lança o imposto denominado Sisas Gerais,
incidindo sobre tudo e todos e passando a permanente.
Ao
povo foi difícil aceitar esta mudança de imposto municipal, utilizado para
aplicar em despesas extraordinárias do concelho, a imposto da Coroa usado não
só para a guerra e exército, como noutras despesas do Estado. Os reis não vão
abdicar dele, tanto mais que significava quase três quartos das rendas da Coroa.
A
permanência do tributo levou a que fossem nomeados muitos oficiais, publicada
legislação e orientações no sector da Fazenda. Em 1520 já os rendeiros das
rendas ou siseiros estão obrigados a usar o novo regulamento das sisas. Estas
vão sendo sempre um problema grave, quer para a Coroa que tinha dificuldade em
arrecadar o imposto, quer para as populações que estavam cada vez mais
contrariadas com o seu crescimento, sentindo-se pressionadas pelos rendeiros; por
isso pretendem deixar de o pagar, como se pode constatar nas cortes de Torres
Novas, 1525. Tal não lhes vai ser permitido, mas apenas o estabelecerem
contratos de sisas com o rei D. João III através dos seus procuradores, onde se fixam quantitativos
inalteráveis. A Covilhã faz o contrato das sisas em 1528, a par de outras povoações.
Primeiramente
são nomeados e escolhidos os procuradores régios e os procuradores dos
concelhos, depois preparado o Regimento e só em seguida negociados e assinados
os contratos das sisas.
Foram
assinados mais de duzentos contratos que se encontravam na Torre do Tombo e dos
quais D. Maria I (1789) mandou fazer uma cópia.
Antes
do Contrato da Covilhã, que é bastante extenso, apresentamos um índice dos
contratos e o Regimento usado para a resolução deste assunto.
ANTT - Contratos D. João III
Índice
Alcongosta – Lº 2, f
77 vº; Lº 6,
f 86
Alcaria – Lº 6, f
73, 86
Belmonte – Lº 7, f
120
Castelo Novo – Lº 3, f 26
Covilhã – Lº 2, f 77; Lº 6, f 86
Valhelhas – Lº 2, f
17
Cêa – Lº 1, f
94 vº, Lº 6,
f 62 vº
Manteigas – não vem
Castelo Branco – não vem
S. Vicente da Beira – Lº 4, f 98; Lº 5, f
37
Penamacor – Lº 7, f
112 vº
Pena Garcia – Lº 2, f 125 vº; f 127; Lº 6, f 46
Guarda – Lº 2, f
93; Lº 7,
f 3
Idanha-a-Nova – Lº 1, f 41; Lº 7, f
35
Idanha-a-Velha – Lº 2, f 11 vº
Sovereira Formosa – Lº 2, f 120
Sortelha – Lº 1, f
91 vº; Lº 6,
f 55 vº
Rosmaninhal – Lº 2, f 26 vº
Sabugal – Lº 2, f
45; Lº 8, 195 vº
Proença-a-Nova – Lº 4, f 59 vº
Monsanto – Lº 2, f
124 vº; Lº 6, f 43 vº
Hoje encontramos estes contratos
no ANTT com o código de referência: PT-TT-COP
A Moeda (iluminura do Livro de Horas de D. Manuel) |
Regimento que levou Christovão Mendes quando foi tratar do
negocio das sisas na Provincia de Tras os Montes
Treslado do Regimento do Licenciado Christovam Mendes
A maneira que vós Licenciado Christovão Mendes do meu
Desembargo avês de ter no dar das sisas aos concelhos da Comarqua da Beira,
Trallos Montes, e Antre – Douro e Minho he a seguinte:
Item.
Primeiramente hyrês à Comarqua de Trallos Montes àquelles lugares que vos
milhor parecer e ouuerdes por enformação que requerem, lhe dem as sisas, ou que
vos parecer que com milhor vontade as querem tomar, e farês juntar em camara os
juizes, vreadores, Procurador do Concelho, aos quaes notificareis o poder que
levaees, e allem dello lhe dirês da minha parte, que nas Cortes, que ho anno
passado fiz em Torres–Novas me foy requerido por alguus dos Procuradores das
Cidades, Villas, e Lugares de meus Reynos, que pelos tirar de grande dano, em
que poderião encorrer, leixando ir as sjssas no crecymento, em que vaão, que
lhes a elles seria mui grave de sofrer, segundo se tem visto por expryencya
pelo crecimento dos annos passados, me pedião por mercê que quisesse a ello
prover, e dar remedio como se atalhasse o que se poderia fazer, querendo eu
tomar delles renda certa, e sabido em lugar das ditas sysas, e lhas alargar,
pera que as mais nom ouuesse, somente a dita renda certa, que antre sy
repartissem, segundo cada hum a merecesse, e que por aqui se tolheriam os
agravos, e opressões que recebem dos oficyaes, e Rendeitos na recadação dellas,
e que eu desejando de lhes fazer mercê, e dar toda boa ordem, e maneira como se
fossem fora dos ditos enconvynientes, vos mando a elles para juntamente
praticardes, e concertades a maneira que milhor seja, porque a mim me praz
lhes leixar as ditas sysas, por renda certa, e sabida, que em lugar dellas me
dem o que vós lhe direis, e representarês pelas milhores pallavras que vos
parecer, porque lhe notificarês a tenção que tenho pera lhe fazer mercê, e os
rellevar dos ditos agravos, e opressões, que dizem que recebem, e vós
trabalharês quanto em vós fôr de no dito caso tomar assento.
E se
entenderdes que pelos da Camara, e os que tem mais poder no povo, que até gora
pagarem menos siza aos Rendeiros, ou nom pagarem nehuas se fez contradição ao
assento, e concerto da dita siza, chamarês os do povo todos por codrilhas, ou
vintenas, ou Fregesyas, como vos parecer que milhor se pode fazer, aos quais
tomai as vozes, e parecer no dito caso, de maneira que todos sejam perguntados
com hu Escripvão, que pera ysso tomarês, e escrepvei seus ditos, e assinados, e
achando por mais vozes, que querem o dito concêrto, e que ho ham por proveitoso
ao povo, o farês, e assentarês segundo o levais por este Regjmento.
Item No dito
chamamento das Camaras mandarês que nom entrem, nem dem voz nenhuu oficyal das
sizas, porque nesta caso, os ey por sospeitos ao povo, antes se souberdes que
alguu delleos de noite, ou de dia anda pelas casas, ou em outra maneira
provocando, ou endozendo os que ham de dar voz no dito caso, ou fazendo por
seus parentes, amigos, e criados, em modo que saibaes, que dello procede, em
tal caso os prenderês, e farês auto de culpa que lhe achardes, e mo farês saber
pera nisso prover como seja justiça e meu serviço, e a mesma maneira terês com
qualquer outra pessoa que achardes que escondidamente andam endozindo, e
provocando as pessoas, que nisso ham de dar voz, por quanto pois estes taees
tem lugar pera em Camara, e em seus Conselhos, e ajuntamentos dizerem o que lhe
parecer livremente por bem seu, e da repruvica, nom se presume, que o quererão fazer
quando escondydamente, e em lugares apartados buscarem modo pera provocar
outros.
Item. O
concêrto que com os ditos Lugares avês de fazer seja dar-lhes as ditas sysas
por outra tanta renda sabyda na contia, em que agora as ditas rendas estam
arrendadas, com condição que farão os pagamentos conformes aos apontamentos que
levaees.
Item. Porque
as rendas dalguus logares estam muyto baixas, e de quebrado, a estes nõ yrês,
porem se por sua parte vos for requerido que lhes dês as ditas sysas poendo-se
ellees em preço onesto, e rezoado, mo farês saber, pera nisso mandar o que for
meu serviço, e bem do povo, e vos terês lembrança de me mandardes enformação de
todo muy decraradamente, a saber, o prêço em que ora estam os taes lugares, e o
porque esteverão os annos passados, e o que mais querem dar, e o que nisso vos
parecer. e porque tambem som enformado que alguus lugares estam muyto altos, e
em mayores preços do que soya ser, a estes dyrês, que por lhes fazer mercê me
praz lhes dar as ditas sysas pera sempre por menos até a decyma parte, do que
agora estam; e porem isto da decyma parte lhe nom decrararês loguo, se nom
quando virdes que he necessario; e se em outra maneira se nom poder concrodyr
(sic), mo far~es primeiro saber, pera averdes minha resposta.
E no dar das
ditas rendas pelo que agora estam, menos a decyma parte, pela maneira sobredita
averês respeito à rematação do Almoxarifado, e as darês segundo couberem em
verdadeira repartição, e se achardes que as ditas rendas demenuirem por engano,
pelos Rendeiros princypaees as quererem tomar pera sy, ou por culpa, ou
negrigencya de meus oficyaees, averês respeito a isso, e as nam darês com a
demenuyção, que enganosamente se fez, mas como verdadeiramente poderião e
deverião caber em repartição segundo a rematação do dito Almoxarifado, e assy
mesmo farês achando que sobyrão enganosamente por dadivas dos Rendeiros, ou
alguus outros enganos.
Item.
Levarês de minha Fazenda o Caderno das rendas, em que ora estam arrematados os
Almoxarifados onde hyes, pera por ellees tomardes enformação da contia, porque
estam arrematados, o qual caderno concertarês com os Livros dos Contos, e
qualquer deferença que nisso achardes, mo farês saber.
E por
quanto do anno de quinhentos e dezanove annos pera caa, som feitos novamente
muytos oficyaes em lugares, em que os nom soya aver; Eu ey por bem q esses taes
nom os haja mais, e esses sejam extintos, e desfeitos sem Eu, nem os ditos
Concelhos lhe avermos de pagar mantimentos alguus, salvo sendo necessarios, q os mesmos hos ajam de usar nos ditos Lugares d’alguns
dos ditos oficyos, porque daquellees oficyaees desses oficyos de que os ditos
povos ouverem de usar, ficarão oficyaesaquellees, que ora som, e tem suas
Cartas.
E quanto aos
outros oficyaes, que som feitos anteez do anno de dezanove, pagarão os
Concelhos seus ordenados, e achando-se por direito que Eu som obrigado ha
compoer, e a stisfazer aos oficyaes seus oficyos, ou outra cousa algua, os
ditos concelhos serão hobrigados ao pagar em sua vyda delles, e fallecendo os
oficyaes, que a satisfação ouverem, ou vagando os ditos oficyos por qualquer
maneira que seja, não avera hi mais os ditos oficyaes, nem Eu, nem meus
oficyaes proveremos mais dellees, e se hacontecer de os darem contra forma do
contrato, a provisão sera nehua, e os concelhos ficarão livres de averem de
pagar mais os ditos oficyaes, e ganharão, e averão pera sy o que ellees soyão
d’aver, salvo aquellees oficyaees, q pera arrecadação dos dinheiros de minhas
rendas forem necessarios, porq a estes pagarão os ditos concelhos seus
ordenados.
Item. Levarão
convosquo hu boõ Tabelião, que em huu livro faça as notas destes Contrautos,
e assy tambem faça outro livro, em que escrepva, e tyre da nota todos os for
pruvico, ey por bem que no que tocar a estes Contrautos possa fazer pruvico, e
o synal que assy ouver de fazer, ficará feito no Livro da Chancelaria dessa
Comarqua.
E nos
Lugares, em q concertarem de tomarem a dita sysa farês o Contrauto, segundo a
nota q delle levaes, e sempre me avysarês do q dos pânos nunca, fazeis em cada
huu lugar, e de qualquer novidade,
q sobre vyer, ou d’outra cousa, que vos parecer, q compre a meu serviço, e todo
vos encomendo, e mando, q façaees com muyta delligencya, e boõ recado como o de
vós confio, e como sempre fezeste as cousas de meu Serviço, de que fostes
encarregado. Escripto em Beja vinte dias de Setembro Bastião da Costa o fez
de mil quinhentos e vinte seis. (1)
Bibliografia – 1) ANTT - Livro 6 das Gavetas, fls 13 a 15vº (?)
Cruz, Maria Leonor Garcia da – “A Governação de D. João III: a
Fazenda Real e os seus Vedores”, Centro de História da Universidade de Lisboa.
“Dicionário de História de Portugal” – Dirigido por Joel Serrão,
Iniciativas Editoriais.
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