Continuamos a
apresentar documentos sobre o comércio ilegal, um assunto que atravessa os
séculos, abarca variados produtos e pessoas e mantém o poder em constante
alerta. Na opinião de Luiz Fernando Carvalho Dias o contrabando de panos é um dos factores que
contribuiu para a concorrência, muitas vezes desregrada.
Estamos em 1846, no
reinado de Dona Maria II, período, a todos os níveis, bastante conturbado. Primeiro
lemos uma carta dirigida à Rainha e assinada por representantes dos fabricantes
da Covilhã. Nela se faz referência ao contrabando de panos espanhóis e ao uso
de panos ingleses que prejudicam a população fabril da Covilhã. Dadas as
dificuldades verificadas, pedem para continuarem a fornecer o tecido para os
fardamentos do exército. Em seguida uma missiva ao Governador Civil
sobre o assunto. Num terceiro documento o governador Civil envia a
petição à Rainha, mas informa também que muitos dos fabricantes da Covilhã são
contrabandistas, que ele não conseguiu erradicar o problema e por isso aqueles
devem ser punidos. Numa portaria ao Governador Civil diz-se que "Auxiliando
o ped.º dos Fabricantes, pede elle s’ adoptem providencias contra
o abuzo que estes comettem."
Representação dos Fabricantes da Covilhã – Informação do
Governador Civil – informação do Ministério do Reino
Sobre a conveniência de se evitar o contrabando de laníficios na Covilhã, como contrario ao progresso das Fábricas e grave prejuízo da população d’aquella villa a qual é essencialmente fabril.
Dona Maria II |
R.C.
N.º 1790 L3.º
Senhora
Os abaixo
assignados Proprietarios, Negociantes e Fabricantes da Villa da Covilhaã e
subditos fieis de Vossa Magestade, vendo com a maior satisfação com
quanto acolhimento acaba Vossa Magestade de receber a geral expressão das
verdadeiras necessidades dos Povos que a Providencia Divina tem confiado ao seu
Reinado, e de manifestar que a felicidade d’ elles he todo o seu Real dezejo,
tractando em Sua Alta Sabedoria de pôr termo a todos os aggravos publicos, de
tranquilizar a Nação, e de satisfazer da maneira mais completa aos justos
dezejos d’ ella; não podem deixar, nem de fazer subir em occaziaõ taõ solemne,
e de tanto apreço, a expressão do seu mais respeitozo e profundo reconhecimento
para com a Augusta Rainha dos Portuguezes pela ineffavel prova que acabaõ de
receber de Sua Real Solicitude sobre a necessidade d’ elles; nem de expôr quaes
sejaõ os d’ esta Villa, supplicando o remedio de que tanto carece.
A antiga Villa
de Covilhaã, toda manufactora que he, por que o mesmo simples Proprietario,
ou Lavrador senão sustenta, decahido que seja o giro do Commercio d’ ella,
merecera sempre aos Senhores Reis Augustos Predecessores de Vossa Magestade
huma particular attenção: as suas Fabricas tem hum lugar na Legislação
Portuguesa. Em tempo antigo, quando mesmo se manufacturavão os pannos pelo
velho regimento chegarão a merecer a aceitação da Côrte e com preferencia aos
Estrangeiros: hoje com o novo processo de fabrico, mais breve, mais
aperfeiçoado, e geralmente uzado nas Nações estranhas, as manufacturas da
Covilhã estaõ apprezentando huma perfeiçaõ por certo superior às o velho
regimento, e que subirá de ponto se tiverem a fortuna de merecer a protecção do
Governo de Vossa Magestade.
Mas he forçozo
confessar / por que as necessidades de hum povo naõ devem occultar-se a seu
Soberano / a decadencia actual de seu Commercio, e a cauza d’ esta, a falta de
extracção dos seu artefactos, e de seu consumo; falta a que se pode assignar
por causa a do na dos pannos Estrangeiros, tanto Hespanhoes que o Contrabando
nos introduz, como dos pannos Inglezes. A milhor de todas as Leis
pragmaticas he o nobre exemplo da Côrte; uzaõ todas seus tecidos nacionaes,
mais Portugueses seraõ os subditos de Vossa Magestade uzando os nossos.
Superiores aos das Nações Estrangeiras estaõ por certo os tecidos de seda e
algodaõ de Portugal; graças ao progresso dos conhecimentos, ao zelo, e ao
patriotismo; e se tanto não pode dizer-se quanto aos tecidos de laã, o seu na,
mediante a Proteçaõ de Vossa Magestade os elevará ao gráo de perfeiçaõ que
revalize com os estrangeiros.
O numeroso povo d’
esta Villa, Senhora, maduro tambem já para a liberdade, por que acaba de dar
provas de sua moderação e docilidade he digno de milhor sorte: grande he o
empenho dos donos e administradores de fabricas e mais fabricantes em
empregarem seus operarios de continuo; porem escasseando sobre maneira o
consumo das fazendas, o subido preço das Laãs no anno ultimo, e a baixa dos
pannos no actual naõ pode deixar de diminuir-lhes seu commercio e diminuido
fica o emprego dos operarios, e por natural consequencia diminuirá a população
da terra.
Eis, Senhora, a
confissaõ franca e sincera dos Supp.es e eis sua respeitoza petiçaõ, de que
supplicaõ e esperaõ o Real Differimento, que he proprio da Regia Solicitude
de Vossa Magestade, como urgente petiçaõ de seus subditos sempre fieis, e
que sempre tem merecido ser esta Villa contemplada com huma boa parte do
fornecimento do panno para o fardamento do Exercito, confiando de que o
continuará a ser, e de que o verdadeiramente patriota, sabio, e Providente
Governo de Vossa Magestade na mais deixará de protegela.
Por tanto.
P.ª
Vossa Mag.e Fidellissima
Haja por bem de acolher esta ferverosa
supplica em Sua Alta e Real Benevolencia e
Contemplaçaõ para serem os supp.es providos de remedio.
Covilhaã 8 de
Junho de 1846.//.
E
R M.e
P.e Joaõ Nunes Mouzaco
Filippe da Costa Freire do Amaral Bottelho
O conego Antonio de Sousa Tavares d’ Azevedo Castelo Branco
O Prior de S. silvestre Manuel Luiz Serrano
O P.r de Santa Maria Joze Nunes Mouzaco
O Prior de S. Pedro Joaquim Joze Ribeiro d’ Oliveira
O P. or da Conceição Gregorio Joze Paes
O P,e Manuel Nunes de Moraes
O P.e Pedro Na.tº de Figd.º
O P.e Manoel dos Santos Paulo
O P.e Antonio Joze dos Rejs
O P.e Bernardo António de Sampaio e Lemos
O P.e José da Silva Morais
O P.e Bernardino Salvador
O P.e João Gomes da Roza
O P.e António Nunes Mousaco
O P.e Martinho da Costa França
O P.e José Rodrigues Salvador
O P.e Bernardo António da Silva
O P.e Francisco de Assis
O P.e Francisco Nunes Mousaco
O P.e José Nicolau Alves
O P.e José Pedro Carqueija
Tomaz António de Sousa Pimentel
Brás António Camolino
O B.el João Pereira Ramos de Carvalho
Francisco Camolino
António Cezário de Sousa Tavares
José de Sousa Tavares
Bernardo de Almeida de Lemos
Joaquim José Correia
O B.el Manuel Nunes Jacinto Mousaco
Francisco d’ Oliveira Grainha
José Valério Paes
José Nunes Jacinto Mouzaco
Manuel Nunes Mouzaco
Diogo José Roiz (1)
José Joaquim Pereira de Carvalho
José Nunes Jacinto Nunes
João António de Figueiredo e Almeida
João da Costa Trenas
Francisco Garcia
José Maria Nogueira
Manuel Fernandes Nogueira
José dos Santos Paulo
Francisco dos Santos Paulo
João Pereira Cadência
António Alves Roiz Caetano
António Nunes Mouzaco
Bernardo Tavares
José Marques Dias
José Dias de Ascensão
Bernardo Tavares Júnior
José Caetano Rato
Francisco Cerveira de Almeida
António Mendes Soares
Francisco Roiz Antunes Castanheira
José Jacinto da Silva
Clemente Ferreira
António de Amaral
João Carlos Craveiro
João Borges Correia
António da Costa Trenas Coelho
Benevenuto José de Macedo
José Fernandes Pereira
Francisco Freire Corte Real
António Maria das Neves
José da Cruz Moreira
Francisco Bernardo Roque
José da Costa Rato
Tomás José Mendes
José Paulo Nogueira
Porfírio José Nogueira
António João Almeida Saraiva de Brito
José Maximino de Vasconcelos Cabral
Januário Gomes Feio
José Bernardo Roque
João António de Oliveira
Francisco Roiz Salvador
********
Illm.º
e Ex.mº Snr.
Dizem os
habitantes da Vila de Covilhã signatários da Representação junta, que tendo
deliberado fazer subir à presença de Sua Magestade Fidelíssima aquela
sua conscenciosa e respeitosa petição, em que expõe as necessidades de sua
Pátria, e lhe dirigem os protestos de seu maior reconhecimento e obediência,
como cumpre a subditos fiéis; os suplicantes não podem tambem por esta
ocasião, deixar de dirigir a V. Exª os seus mais sinceros agradecimentos
pelas acertadas medidas que a Sabedoria de V. Ex.ª tem empregado para o
restabelecimento da ordem e da paz, a fim de respeitar-se a acção
reguladora do Governo; certos e confiados estão os mesmos suplicantes que a
perspicácia, sabedoria, e rectidão de V. Exª continuará como é próprio de tão
conspícuo Magistrado, e de que em outro tempo este Distrito recebera já provas
inefáveis, a fazer a protecção, e felicidade dele, e assim confiados na mesma
protecção, os suplicantes oferecem à censura de V. Exª. aquela sua
Representação para que achando-se conforme com as necessidades que expõem, se
digne fazê-la subir ao Governo de Sua Magestade. Portanto.
P.
a V. Exª Senhor Governador Civil de Distrito
se
digne tomar esta com a inclusa na sua sábia
consideração
E R M.e
********
2.ª D. 2ª Rep. L3 Nº. 70
Governo Civil de Castelo Branco
1ª Direcção
Nº 71
Illm.º
e Ex.mo Snr.
R.C.
Nº 1790 L3.º
Tenho a honra de
remetter a V. Ex.ª a inclusa Representação que os Proprietarios, Negociantes, e
Fabricantes da Villa da Covilham dirigem à presença de Sua Magestade a Rainha,
e na qual os signatarios protestão a sua adhesão e obediencia à Mesma Augusta
Senhora, apontão a origem da decadencia das Fabricas d’ aquella Villa, e pedem
providencias para a prompta e facil extracção dos seus artefactos.
Como informo à
referida Representação tenho a honra de dizer a V. Exª que a Villa da Covilham
é essencialmente manufactureira, - que o sustento de seos numerosos habitantes,
e o augmento de sua populaçaõ, dependem da prosperidade dos seos
estabelecimentos fabrís: Convenho com os signatarios em que o uso dos pannos
Ingleses, e o Contrabando dos panos Hespanhóes, é um dos maiores obstáculos
ao desenvolvimento da nossa indústria fabril, no entanto devo declarar a V. Exª
que durante a primeira epocha da minha administração n’ este Districto, fiz
todos os esforços para evitar a introducção dos pannos Hespanhóes sem que o
pudesse conseguir, por que os proprios Fabricantes da Covilham érão os
maiores Contrabandistas – que não só introduzião já promptos os panos
Hespanhóes, os nacionalisavão pondo-lhes o sello das suas Fabricas; mas até
mandavão vir de Begar a lam já fiada e tinta, e com ella fabricavão panos que
vendião como fructo da industria do Paíz. Estou certo que V. Ex.ª tomará
a mencionada Representação no sentido favoravel, e que apar das providencias
que os suplicantes pedem, V. Exª tomará as que reclama a fé publica ultrajada,
pela venda dolosa de panos estrangeiros, apresentados pelos Fabricantes, como
productos Nacionaes.
Deos
Guarde a V. Ex.ª
Castello-Branco 15
de Junho de 1846
Illm.º e Ex.mo Snr. Luiz da Silva Mousinho d’ Albuquerque
O
Govern.ºr Civil
João José Vaz
Preto Giraldes
********
L3 nº 70
2ª Direcção – 2ª Repart.
Os Fabricantes
de pannos da Villa da Covilhã ponderando que o sustento da sua população
depende da prosperidade dos seus numerosos estabelecimentos fabris, de presente
acabrunhados no seu desenvolvimento pela introdução e contrabando dos pannos
Hespanhoes e Ingleses; pedem providencias que facilitem a extracção dos
productos por elles manufacturados. D’entre as que lembrão, huã é o serem
contemplados no fornecimento de panno para o exercito.
O Gov.ºr Civil,
informa ser exacto o q os Supp.es allegão, porem observa que elles são
huns dos Contrabandistas, e que durante a sua primeira adm.ão fizera os maiores
esforços por evitar este contrabando; sendo de notar que os Fabricantes os
nacionalisão pondo-lhes as marcas das suas Fábricas.
Auxiliando o
ped.º dos Fabricantes, pede elle s’ adoptem providencias contra o abuzo
que estes comettem.
Em
23 de Junho de 1846
Albano
da Sylveyra
Portaria ao G. C. de Cast.º
Branco em 7 de Julho 1846
Fonte – Arquivo do Ministério das
Obras Públicas, ms. 38. (Papéis sobre o Contrabando de Lanifícios na Covilhã)
Nota dos editores - 1) Tetravô do editor.
Nota dos editores - 1) Tetravô do editor.
As Publicações do blogue:
http://covilhasubsidiosparasuahistoria.blogspot.pt/2012/09/covilha-as-publicacoes.html
As publicações sobre os contributos para a História dos Lanifícios:
http://covilhasubsidiosparasuahistoria.blogspot.pt/2011/05/covilha-contributos-para-sua-historia.html
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