quinta-feira, 15 de dezembro de 2011

Covilhã - Os Forais e a População nos séculos XV e XVI - IV

Hoje vamos apresentar opiniões várias, e por vezes incompletas e dispersas, de Luiz Fernando Carvalho Dias sobre forais e censos, em especial as relativas ao censo de 1496 e ao Foral de D. Manuel. Depois seguir-se-á o Censo de 1527.

     Antes dos finais do século XV: Terá havido um censo anterior? Existe uma notícia esquecida na obra de um grande jurista (Professor Doutor Magalhães Colaço?) de um censo do século XIV.  Será de facto um censo?
            Costa Lobo chega a dar-nos alguns números demográficos, mas díspares, do século XV, sem contudo lhes procurar dar um sentido de unidade e sem que eles lhe sugerissem a existência dum censo global ou parcial do país.
            Há um censo do século XV desconhecido e o documento novo [o Numeramento de 1496] que o comprova. Seu carácter nacional. “Caderno das Rendas e da Gente da Beira”. (1) Data presumível desse censo? O achado levou-nos a organizar um quadro. Escreveu Luiz Fernando Carvalho Dias e nós, editores, pensamos que seja o quadro que agora apresentamos:

Beira Baixa e Beira Alta


Sec XV
Sec XVI
Observ


Censo 1527
Doc. Visc. Santarém
Doc. Dioceses


Covilhã


2334

819
3241
4060


4060

Valhelhas
230



430
Pampilhosa



137

Castelo Branco


820

870
547
1417


1417

S.Vicente da Beira

337



582

Castelo Novo



571


Sortelha


140
78
---
383



Atalaia



62

Idanha-a-Nova




267

Idanha-a-Velha




199

Segura



200

Salvaterra
130


239

Pena Garcia



42


Monsanto



300?

356
138
494


494

Rosmaninhal
70


191

Manteigas
220



397

Penamacor


115
380

446
418
864


864


Belmonte



88
159
---
244



244

Oleiros



289

Alvaro



215

Bemposta



39

Proença
130


219


Guarda



1000
379

2321
379
1942
2321


2321


2321
  
            Trabalho de investigação local a realizar, para integrar os seus números.
            Não se trata do censo do século XVI (1527), porque os seus números são diferentes, como já provámos! Se não fora os seus números, era o facto de constituir a região perdida.
            Não se trata do processo para os forais!
            É um documento autêntico e original com ligações com o Rol dos Corregedores das Comarcas (Regimento) de D. Afonso IV. (Já publicado)
            Esse documento revela já uma técnica censitária anterior à utilizada no século XVI em algumas províncias: comprova que no século XVI se tomou já por modelo a técnica do censo anterior.
            Os números do nosso documento estão para os do século XVI numa mesma progressão que os de Costa Lobo - o que revela serem da mesma data.
            O facto dos números do censo do século XVI serem ainda utilizados muito mais tarde levam-nos a concluir que com os do século XV o mesmo aconteceria.
            A rapidez da recolha pressupõe a existência de um trabalho anterior, axioma também aplicável ao censo de 1527: ou então a existência de um censo permanente da população com fins fiscais, militares, e económicos - actualizável dentro de períodos e períodos certos.

            Na época de D. Manuel, no conceito de vizinho há que considerar um conceito restrito e jurídico que é aquele que as leis e regulamentos e forais deixam transparecer e outro, mais vasto, que englobaria aqueles indivíduos que embora não constituindo lar por si, com bens ou mesteres, contudo se apresentavam como verdadeiras unidades populacionais: este conceito englobaria os frades e os mendigos, mas nunca seria tão vasto que pudesse abranger os escravos como a teoria de Cristóvão Rodrigues deixa transparecer. Por isso explicitamente teve que os declarar incluídos nos seus números. Já assim não acontecia com o censo de 1527. Este regista os vizinhos no estrito conceito jurídico, embora em algumas comarcas, inspirado certamente por razões de recrutamento militar, abra um capítulo à parte para os mancebos solteiros de 18 a 30 anos.
            O conceito jurídico de vizinho relacionado com o claro sistema utilizado por Cristóvão Rodrigues e com uma apurada leitura do censo de 1527 dão-nos a chave para a interpretação deste.

            Azurara dá-nos na Crónica da Guiné a população da Madeira:
150 moradores que Gama Barros equipara a fogos pois o mesmo Azurara acrescenta:

 a fora outras gentes que aí havia, assim como mercadores, e homens e mulheres solteiros e mancebos e moços e moças, que já nasceram na dita ilha, e isso mesmo clérigos e frades e outros que vão e vêm por suas mercadorias e coisas que daquela ilha não podem escusar“.
             A referência a clérigos e frades e mercadores demonstra que se refere a fogos ou a vizinhos. Não seriam os clérigos e frades e mercadores considerados vizinhos?
            Normalmente o número de vizinhos é fácil de manter, visto que os maiores movimentos da população são fora desta denominação.
            A fixação do número de besteiros em cada concelho devia derivar não da população mas das necessidades de defesa e das condições da guerra e da adaptação do povo a esse género de arma. Que a população nada devia ter com o assunto deriva do minúsculo concelho de Valhelhas ter 36 besteiros e a Covilhã somente 30 .

       Nem sempre a nomenclatura dos recenseados é idêntica à carta del Rei e isso só demonstra que os números recolhidos têm por base a forma tradicional na região de recolher o número de vizinhos e é filha do tipo  e fim da recolha inicial existente. Nos números de 1496 é curioso notar que se declara expressamente no capítulo da Covilhã que não dão mais elementos por não serem pedidos:

 São do número do povo com os judeus que são cento e oito, dois mil e trezentos e trinta e quatro pessoas E nesta conta entram muitos escudeiros criados del Rei nosso senhor e doutro muitos fidalgos que não vão nomeados pelos seus nomes porque no mandado se não contém nem faz declaração. Feito aos 16 dias de Março Afonso Álvares o fiz de 1496.
            Outras notícias do nosso documento para a história económica e jurídica do País:

            Os direitos reais na Beira antes da reforma dos forais e sua comparação com estes em cada concelho. No foral da Covilhã, outorgado por D. Manuel, à semelhança de outros forais, concede-se à vila a liberdade, direito expresso nestes termos:

 E por quanto no dito foral dado aa dita villa he posto por privilegyo e liberdade especial que nunca seja dada nem tirada da nossa coroa do Reino. A nos praz de o asy aprovar e confirmar pera sempre sem mays outra confirmação averem pera yso nunca mester.“

            A este privilégio não faz referência a Inquirição, certamente porque ela não constava do foral de D. Sancho. Não existia no foral da Covilhã esta disposição que, por exemplo, o foral da Guarda continha e a que Herculano faz referência especial na sua “História de Portugal”:

 “Damos a vos inda por foro que nom ayades outro senhor senom nos reys, e nossos filhos e quem o concelho quiser“.
             Foi certamente por renúncia deste privilégio que a Covilhã foi dada, em doação, no século XV, aos Infantes D. Henrique, D. Fernando, D. João e D. Diogo e a D. Manuel e depois no século XVI, privilégio de liberdade ao Infante D. Luiz, filho do último senhorio. Estas doações dos bens da Coroa do Reino estavam sujeitas a leis especiais na sua transmissão, pois sendo de juro e d’ herdade, só podiam transmitir a  “filho lidemo”. Foi por isso que o Infante D. Henrique adoptou o Infante D. Fernando, como filho; e a D. João, seu filho veio a suceder seu irmão D. Diogo, por dispensa régia. Como a este foram tirados os bens, não teve sucessor, que devia ser D. Manuel, duque de Beja - a quem, no entanto, D. João II fez doação directa da Covilhã.

 Infante D. Henrique, 1º Senhor da Covilhã

Dados relacionados com a doação da Covilhã ao Infante D. Henrique:
- Évora 4 de Dezembro de 1449. É dada por se ter perdido a anterior de D. João I (Livº 3º dos Místicos – fls130).
- Carta de ofício de fronteiro mor da Beira ao Infante D. Henrique, Santarém, 9 de Maio de 1440 (ano de Cristo) (Livro 3º dos Místicos, fls 181, idem fls 19).

- Ao Duque de Vizeu e Sñor da Covilhã Dom diogo, doação que falecemdo ele sem filho que sua erança aja de erdar ha aja e suceda cada um de seus irmãos dom duarte e dom manoel que a esse tempo ficar maior
Porto, 7 de Agosto de 1471 (2)

  • A Administração Pública nessa área antes das reformas manuelinas.

  • Concelhos rurais e concelhos com o predomínio da nobreza.

  • A importância das judiarias da Beira

 - Rendimento de várias judiarias da Beira e dos seus donatários, quando da expulsão dos judeus e das tenças que substituiram essas rendas:

a) Guarda: 20.000 rs em satisfação da judiaria desta cidade, a João de Sousa e sua mulher Branca daTaíde.
Carta de D. Manuel, de Évora, 28 de Novembro de 1497.    (Lº 1º dos Místicos, fls 168).
b) Covilhã: 42.500 rs “ a Dom Rodrigo de Castro, padrão de corenta e dous mil e quinhentos Reaes de tença en satisffaçam das Rendas da Judiaria da villa de Cubilhãa “ Évora, 16 de Novembro de 1497.
Esta tença vigorava a partir de 1 de Janeiro de 1498 e andaria sempre com o castelo e rendas dele, assim e na maneira que a dita judiaria sempre andou, sendo assentada e paga pelas sizas da dicta vila de Covilhã, do corpo da vila; será paga aos quartéis do ano, pelo almoxarifado da Guarda.
 c) Monsanto: 5.760 rs. “ a dona Johanna de Castro cinco mjll e sete centos e sassenta rrs. de juro e herdade em satisfaçam da rremda que rremdiam hos judeus da villa de momsamto “ (carta régia : Sintra, a 8 de Agosto de 1499 - fls 107 vº, Lº 5º dos Místicos).
- Não faz o documento que comentamos qualquer referência à judiaria ou mouraria em Penamacor, Idanha, Belmonte, Valhelhas, Manteigas e Rosmaninhal, quando é certo que anos depois vamos encontrar uma grande percentagem de cristãos novos entre os habitantes das três primeiras vilas e ainda no século XV temos notícia de alguns judeus que as habitaram.
            Delas citaremos apenas o tecelão Mail Levy, que alcançou carta de privilégio de El Rei D. Afonso V, dada na Covilhã a 2 de Novembro de 1453. (Chancelaria de D. Afonso V, Lº 4, fls 38 vº).
            Na chancelaria de D. João I há um documento referente à comuna dos judeus de Penamacor.
            Em Sortelha e Proença não existiam judiarias, porque o declara expressamente a diligência presente. Ficam assim determinadas e conhecidas as judiarias da Covilhã, Monsanto, Castelo Branco, S. Vicente da Beira e Salvaterra. (1)

- Sizão dos Judeus: D. Manuel, em satisfação das rendas de sizão dos judeus que havia nestes reinos, deu a D. Antam d’ Abranches, um padrão de 400.000 rs. de tença, para ele e para um seu filho, por carta de Lisboa, a 18 de Abril de 1504. (Lº 2º dos Místicos, fls 278)
             Da mesma carta consta que a outra doação do Sizão já fora feita a D. Fernando de Almada, por D. Afonso V, em Arronches, a 10 de Maio de 1475. Esta doação de D. Afonso V, foi confirmada por D. João II em Beja, a 24 de Março de 1489. ( Lº 2º dos Místicos, fls 189 ) Mas a renda do sizão dos judeus do reino estava já anteriormente na posse dos Condes de Abranches, pois D. Álvaro, que morreu com o Infante D. Pedro em Alfarrobeira, também tivera essa mercê, conforme se verifica da doação que D. Afonso V fez dela a D. Catarina de Castro, viúva do mesmo conde, em Lisboa, a 22 de Julho de 1449. (Lº 2º dos Místicos, fls 111)

- Escrivaninhas das Câmaras das Comunas dos Judeus: Não refere o documento que estamos a comentar o rendimento das Escrivaninhas das Câmaras das Comunas dos Judeus, embora refira, quanto à Covilhã, a existência dos respectivos ofícios e seus titulares. Sabemos porém que o rendimento das escrivaninhas em todo o reino, era de 12.000 Rs. e era seu donatário Aires da Cunha, a quem D. Manuel, em Lisboa, por carta de 21 de Março de 1499, confere um padrão de tença dessa quantia, em satisfação das mesmas, para receber a partir de 1 de Janeiro de 1500, porque foi o que se achou, por “masa” de três anos, renderem em cada um ano. (Lº 4º dos Místicos, fls 70 e 70 vº)

Nota dos editores – 1) Já tocámos neste assunto em episódios anteriores. 2)Vamos publicar documentos relacionados com o senhorio da Covilhã.  

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