Judeus naturais ou moradores na Covilhã, referidos nas Chancelarias Régias do século XV
Hoje apresentamos uma lista de judeus covilhanenses, ou, pelo menos, moradores na Covilhã, no século XV. A grande maioria pertence à família Vizinho. Em seguida mostramos documentos sobre eles, que em 1987 Luiz Fernando Carvalho Dias transcreveu das Chancelarias de D. Afonso V, de D. João II e de D. Manuel. Existem provas de que os Judeus se fixaram na Covilhã a partir da segunda metade do século XIV. A comunidade cresceu muito, até que as medidas régias anti-judaicas contribuíram para uma redução, embora conheçamos muitos cristãos-novos, como a família Vaz, que continuaram a sua vida na Covilhã. Esta comunidade, para usufruir de liberdade e manter os seus usos e costumes, pagava tributos elevadíssimos. Ela “pertence ao rei” que lhe dá ou confirma determinados direitos por meio de cartas de privilégio, como a seguir veremos alguns exemplos: fazer contratos de compra e venda (como os cristãos); “andar em besta muar de sella e freo”; “ hussar de arte de celorgia per todos nossos regnos e senhorio”, fazer remédios e curar, mesmo sem estudos, mas com prática; carta de segurança; isenção de serviços, como cumprir e guardar as liberdades de não aposentadoria; cartas de perdão, com a obrigação do pagamento de uma multa para a “arca da piedade”, onde se guardavam donativos régios para obras pias.
Colofon e selo de José Vizinho na edição de 1496 do Almanach Perpetuum (BNL) |
Documentos sobre Judeus
f. 60
Item outra carta de Sallamam Vizinho mercador morador em Covilhãa ec. dada em Sanctarem xxix de Novembro per o decto doutor Lourenço Abul a fez Era iiijcRj ( 1441)
It outra tal carta a Juça Vizinho de Covilhãa ec. dada em Sanctarem ix de Janeiro per o decto doutor Lourenço Abul a fez ano de iiijc Rij (1442)
f. 60v
It outra tal carta de Samuel Vizinho de Covilhãa ec. dada em Santarem biij de Março per o decto doutor e scprivam Era iiijc Rij. (1442)
ANTT - Chanc. D. Afonso V, Livro 2, fls. 6 e 6v
f. 114
Dom Affomso ec. A quantos esta carta virem fazemos saber que nos querendo fazer graça e merçee a Juça Baru ferreiro morador em Covilhãa Teemos por bem E Mandamos que possa comprar e vender a tempo çerto ou pagar logo com christãos E com outras quaesquer pessoas segundo o fazem e podem ffazer aos naturaaes christãos dos nossos Regnos E Porem mandamos a todollos tabeliaaes e scprivaaes que daqui em deante lhe façam todallas cartas e estromentos de compras e vendas e outros quaesquer contrautos que elle ffazer quiser assy e pella guisa que o ffazem os christãos de nosso Senhorio Os quaes contrautos mandamos que ssejam chaãos e ssem nenhuüas penas E sejam fecctos e outorgados perante o Juiz do lugar honde sse ouverem de ffazer e outorgar Ao qual juie e tabeliam Mandamos que sejam a ello bem rresidentes E o decto juiz de juramento aas partes a cada hüu em sua lley se nos dectos contrautos com alguu conluyo ou engano ou outra algüua specia de husura E o tabeliam ou scprivam o scpreva assy E mandamos a todollos juizes e justiças dos nossos Regnos E a outros quaaesquer juizes justiças a que desto conhecimento perteeçar que lhe façam per as dectas ccartas e estromentos e contrautos en que desta nossa carta ffor feccta meençom comprimento de direito e justiça Segundo o fazem aos christãos de nossa terra E esta graça lhe ffazemos enquanto nossa merçee for Nom embargando lex hordenações mandados defesas em contrairo desto fectas E nos contrautos que fezer faça meençam desta nossa carta E doutra guisa fazendo perca todo pera nos E em testemunho desto lhe mandamos dar esta nossa carta. Dada em Coymbra xxbij dias de Setembro EI Rey o mandou per o doctor Ruy Gomez d’Alvarenga seu vassallo e do seu desembargo e partiçoões E chanceler em logo do arcebispo de Bragaa seu primo e chanceler maor Joham Martinz a fez Ano de iiijc Rij & E eu Lop’Afomso Secretario do decto Senhor Rey que esta carta fiz screpver e aqui sob screpvy • (1442)
f. 115
It outra tall de Mousem Vizinho jubiteiro de Covilhãa ec. dada em Coinbra xxij d’Outubro / …1442 anos (1).
(1). Falta devido a corte no pergaminho.
A N T T – Chancelaria de D. Afonso V, Livro 23, fls. 114 e 115
f. 192v
It carta de meestre Guedelha judeu morador em Covilhaa / cellorgiam do Ifante dom Henrrique e ec. Em que lhe dam licença e lugar que da feitura desta carta ataa tres anos / possa andar em besta muar de sella e freo e ec. Carta em forma. Dada em Santarem xxbiij dias de Dezenbro. Lopo Ferrnandez a fez Ano de nosso Senhor Jhesü Christo de mil iiijc L.ta (1450)
f. 193v
Dom afomso e ec. A todollos corregedores Juizes e Justiças dos nossos rregnos e Senhorio a que esta nossa carta for mostrada ssaude. Ssabede que Nos querendo fazer graça e merçe a meestre Guedelha Guoleimo celorgiam do Iffante dom Henrrique meu muito preçado e amado thio // Teemos por bem e damos lhe licença e lugar que elle husse e possa hussar da arte de celorgia per todos nossos rregnos e Senhorio como decto he / Nam enbargando lex e hordenaçoões que em contrario dello teenhamos postas porquanto fomos çerto per meestre Gil nosso celorgiam moor a que o nos mandamos exeminar que era hidonyo e pertençente pera hussar da decta arte E porquanto nos mostrou e fez çerto per huü alvara que tynha do decto nosso çellorgiam moor como ante da nossa defessa e mandado que ora novamente fezemos que nenhüu phisico nem celorgiam Judeu sseja examinado nem aja carta de licença pera hussar das dectas siençias E elle era com examinado e tynha o decto alvara pera hussar dello por çerto tempo a qua tirasse ssua carta Porem vos mandamos e defendemos que o leixees hussar da decta arte de çelorgiam como decto he // E o nom prendaaes nem comssentaaes prender nem lhe sseer fecto nenhü dessaguisado pello que decto he / O quall mmeestre Guedelha jurou per ssua ley em a nossa chançelaria que bem e direitamente e ssem nenhuü engano nem malliçia obre e husse da decta arte com christaãos judeus e mouros E outro nenhüu nam ssalvo aquelles que nossas cartas teverem E aI nom façades El Rei o mandou per meestre Gill sseu celorgiam moor. Dada em Santarem xxbiij de Dezembro era do nascimento de nosso Senhor Jhesü Christo de mill iiijc Lj anos. Antam Diaz a fez &.(1451)
A N T T – Chanc. De D. Afonso V, Liv. 34, fls 192v e 193v
*
Dom Afomso ec. A todollos corregedores Juizes e justiças de nosos Regnos e senhorios a que esta carta for mostrada Saude sabede que a nos veeo meestre Samuell Guolleima sellorgiam morador em Covilhãa E nos disse que elle sabia tamto de física que elle poderia della bem husar e praticar se nam fosse ho reçeo que tynha da pena da nossa hordenaçom porque nom era pera ello examinado nem tynha nossa lliceemça pera della poder husar E que Nos pedia que o mandasemos examinar ao nosso ffisico moor E achamdo o elle pera ello sobfiçiemte lhe mandasemos dar nosa carta na forma acustumada E Nos veemdo o que nos asy pedia E queremdo lhe fazer graça e merçee mandamos ao doutor meestre Afomso Madeira nosso físico moor E examinador dos fisicos dos nosos Regnos e Senhorios que o examinasse E porque fomos çerto que o examinou e o achou asaz idoneo pera ello // Teemos por bem E damos lhe loguar e liçença que elle husse da decta fisica e arte per todos nosos Regnos e Senhorios e vos mandamos que sobre ello nom lhe ponhaes alguu enbarguo nem consemtaaes poer porque asi he nosa merce o quall meestre Samoell Guolleima jurou em sua lley em a nossa chançelaria que bem e verdadeiramentehusse deste ofiçio a proveito de noso poboo. Dante em a nossa muy nobre e senpre lleall çidade de Lixboa ano de nosso Senhor Jhesu (Christo) de mill iiijc Lx EI Rey o mandou pello decto meestre Afomso Madeira seu físico moor E examinador dos fisicos de seus Reynos e Senhorios na decta çidade aos dezasete dias de Setembro da sobre decta era & (1460)
A N T T – Chanc. de D. Afonso V, Liv. 38, f ls 41
*
f. 25 (1.ª col. )
It outra tall de Jacob Vizinho morador em Covilhãa a xbiij d'Agosto em Sanctarem per o sobredecto Bras Afonso Fernam Vaaz a fez era presente.It outra tal de Juça Vizinho morador no decto logo a xx de Mayo Alvaro Afonso a fez e etc.
It outra tal de Jaco Amado ferreiro morador em no decto logo a xx de Mayo Alvaro Afonso a fez e etc.
A N T T - Chanc. de D. Afonso V, Liv. 31, f . 25v ( l.ª col. )
(Continua)
Notas dos editores – 1) José Vizinho é da Família Vizinho, com toda a probabilidade natural da Covilhã e morador na mesma vila. Era médico (físico) e astrólogo de D. João II, que o mandou ir à Guiné medir a altura do sol no equador e adaptar o astrolábio para as viagens dos marinheiros. Também como astrólogo terá entregado a Pêro da Covilhã a carta que o levaria ao Oriente para saber novas daquelas paragens, antes da viagem à Índia por mar. Traduziu do hebraico para latim e para castelhano o Almanach Perpetum de Abraão Zacuto, texto relacionado com a navegação astronómica e que foi um dos primeiros livros impressos em Portugal. Como médico é provável que tivesse acompanhado D. João II no fim da sua vida. 2) Mestre Guedelha pertence à importante família Negro e era rabi-mor, além de físico e astrólogo. Recebeu, e seu pai, muitos privilégios, como uma tença de 3000 reais para frequentar o Estudo Geral. 3) Samuel Abenasell, pelo contrário, recebeu uma carta de privilégio para poder curar e fazer remédios, mesmo sem ir estudar, mas porque a prática lhe dera conhecimentos suficientes.
Fontes – ANTT: Chancelarias. “Dicionário de História de Portugal, dirigido por Joel Serrão. Tavares, Maria José Ferro, “Os Judeus em Portugal no século XV”, Lisboa, Universidade Nova de Lisboa, 1982. http://cvc.instituto-camoes.pt
As publicações no blogue:
http://covilhasubsidiosparasuahistoria.blogspot.pt/2012/09/covilha-as-publicacoes.html
Estatística baseada nesta lista dos sentenciados na Inquisição:
http://covilhasubsidiosparasuahistoria.blogspot.pt/2011/11/covilha-lista-dos-sentenciados-na.html
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